08 de maio de 2017

O DESMONTE DO POLICIAMENTO OSTENSIVO NO RIO!

1. O secretário Beltrame, ao assumir em janeiro de 2007 e dentro de sua capacitação como polícia de inteligência, destacou que iria identificar os depósitos de armas e drogas nas comunidades e desintegrá-los. Depois, com o ataque e assassinatos de PMs, alterou sua estratégia e iniciou ações repressivas contra o tráfico em várias comunidades.

2. Num terceiro momento, desdobrou as ações que, por anos, foram realizadas contra o tráfico em favelas, como postos policiais e permanência no perímetro delas, e lançou o programa das UPPs, unidades de polícias pacificadoras. Agora, em comunidades selecionadas, a presença da polícia seria permanente.

3. As ocupações pela PM eram pré-anunciadas, dando tempo aos bandidos para mudar de endereço. Começando pela Zona Sul do Rio e em seguida pela Tijuca, em bairros de classe média, as UPPs foram saudadas como uma grande vitória na segurança pública. A imprensa do Rio e de S. Paulo abriu seus editoriais para comemorar e apoiar. A presença do secretário Beltrame, para jantar em restaurantes, era recebida com aplausos por todos de pé.

4. Para garantir a permanência das PMs nas UPPs era necessário multiplicar o efetivo por morador.  O normal, num batalhão da PM, são 1000 PMs para 400 mil habitantes, ou 1 PM para 400 habitantes. Mas, nas UPPs, essa relação, à partir das primeiras favelas ocupadas, era de 1 PM para 30 habitantes, ou menos.

5. Com essa proporção, impôs-se a necessidade de reduzir o número de PMs dos batalhões, indo para as UPPs e aumentar o efetivo através de concursos. E retirar os PMs do trânsito, entrando terceirizados pela prefeitura.

6. O esvaziamento do policiamento ostensivo foi flagrante. Quase não se via mais PMs circulando no clássico policiamento ostensivo. De forma a que a percepção pelas pessoas da ausência de policiais não gerasse insegurança, multiplicou-se o número de viaturas que, circulando, criavam a sensação de presença da polícia. Mas isso não é policiamento ostensivo.

7. A curva decrescente de homicídios no Rio e em S. Paulo -que já vinha de vários anos, inclusive em função do deslocamento do corredor de exportação de drogas para o Nordeste em direção à África Ocidental- foi associada à uma nova política de segurança via UPPs. Ilusão.

8. Na medida em que a saída dos traficantes de várias comunidades não foi acompanhada pela saída do tráfico de drogas, era evidente que o retorno do efetivo de traficantes anterior era “missa anunciada”.

9. E tanto ou mais grave ainda foi o fato que com traficantes deslocados e comunidades ocupadas, o crime de rua não diminuiu como os homicídios, muito pelo contrário. E na medida em que o tempo passava, os crimes de rua cresceram exponencialmente.

10. E a delinquência passou a ser ostensiva e cada vez mais violenta, com imagens que as TVs flagravam sem dificuldade e que as pessoas passaram a ver -e sofrer- no seu cotidiano. Crimes de rua de todos os tipos: assaltos, roubos de veículos, roubos de celulares, roubos de carga, banalização das mortes em assaltos, etc. E estupros, assaltos a residências, a veículos…

11. A presença violenta e ostensiva de gangues do tráfico nas ruas passou a compor a cenografia urbana. Registre-se que a crise fiscal do Estado, com atrasos de pagamentos etc., veio após a reversão do quadro de criminalidade no Rio.

12. Se pelo menos a memória estivesse presente no gabinete do secretário de segurança, haveria uma referência ao final de 1994 e início de 1995, quando a intervenção do exército no Rio, ocupando favelas, foi também saudada como um novo momento. Mas o crime veio para as ruas e os delitos foram multiplicados. A resposta encontrada pelo governo estadual da época foi exponenciar a repressão.

05 de maio de 2017

YAIR LAPID CRESCE NA POLÍTICA ISRAELITA!

1. Yair Lapid é um caso de sucesso na política israelita, estando à frente nas sondagens há seis meses. Defende a criação de um Estado palestiniano, mas recusa negociar com o Hamas. Antigo jornalista, apresentador do jornal televisivo mais popular de Israel e de vários talk shows e com uma curta carreira de ator, Yair Lapid trocou as câmaras pela política em 2012 ao fundar o Yesh Atid (Há um futuro), um partido centrista. Atualmente, e com o possível cenário das legislativas de 2019 serem antecipadas, surge como o homem capaz de roubar nas urnas a liderança do governo a Benjamin “Bibi” Netanyahu.

2. Filho de Tommy Lapid (1931-2008), escritor e político secular, a carreira política de Yair, de 53 anos, e do seu Yesh Atid começou de forma fulgurante. Nas eleições parlamentares de 2013, um ano depois da sua fundação, tornou-se no segundo partido mais votado do país, conseguido 19 dos 120 lugares do Knesset, o que lhe deu o bilhete de entrada na coligação governamental liderada pelo Likud, de Benjamin Netanyahu. Em março de 2013, no âmbito desta aliança, Lapid tornou-se ministro das Finanças.

3. Nesse ano, a revista Time colocou-o na sua lista das cem pessoas mais influentes do mundo. Nas eleições seguintes, o Yesh Atid recusou fazer parte da coligação do primeiro-ministro, tendo-se juntado à oposição após sofrer um revés nas urnas – passou a quarta força política do Parlamento, com 11 deputados. Nestes últimos cinco anos já lhe chamaram de tudo, desde oportunista a zero político.

4. Mas agora, com a possibilidade cada vez mais real de Israel passar por umas eleições antecipadas devido aos problemas judiciais de Netanyahu, Yair Lapid surge como o único capaz de derrotar Bibi, que vai no seu quarto mandato como primeiro-ministro. Agora é visto por muitos como a versão israelita uma celebridade que virou político com talento para slogans.

5. A última sondagem, da Old Dialog/Channel 10 e publicada no dia 5, mostra que o Yesh Atid poderá conquistar 29 lugares, mais dois do que o Likud. Números que seguem a tendência dos últimos seis meses. “Não consigo pensar em outra democracia na qual a mesma pessoa era primeiro-ministro, ou presidente, ou chefe de Estado em 1996 e ainda continua à frente do país”, disse Lapid em março, referindo-se a Netanyahu. “O país precisa de seguir em frente. Estamos presos no mesmo lugar já há algum tempo”.

6. Desde a última vitória de Netanyahu, em 2015, que Lapid tem apostado numa mensagem para conquistar o eleitorado do centro no que diz respeito à política interna, mudando as prioridades do Estado de Israel – colocar a classe média no centro da atividade económica, divisão igualitária dos direitos e deveres dos cidadãos, promoção da educação, reduzir o peso do governo e lutar por um acordo com os palestinianos.  Uma intenção que vem acompanhada de palavras duras em relação aos palestinos – o ex-jornalista diz apoiar um Estado palestino, mas defende a construção de um muro em volta dele.

7. Em dezembro, Yair Lapid afirmou que, ao contrário dos palestinos, que “chamam porcos e macacos aos judeus”, Israel garante o cumprimento dos direitos humanos. “Por que é que não vão a Gaza ou à Cisjordânia e perguntam sobre os direitos das mulheres, os direitos da comunidade gay, os direitos dos cristãos?”, afirmou, defendendo que os mídia internacionais é que estão a perpetuar o conflito israelo-palestiniano, pois desencorajam os líderes palestinos a fazerem as concessões necessárias para a paz.

8.  “Muitas vezes, o presidente Abbas provou não ser um parceiro para a paz. Três vezes nos últimos 15 anos foram oferecidas aos palestinos mais de 90% do que eles pedindo e por três vezes eles disseram não. Eles têm de perceber que não vão ter tudo o que querem”, declarou Lapid numa entrevista ao The Washington Post. Para o líder do Yesh Atid, o processo de paz tem de começar por Gaza, que é um “assunto mais simples”.

9. “Não existem judeus em Gaza, não há locais sagrados. Não vamos falar com o Hamas, mas com protagonistas regionais presentes, teremos moderadores que servirão de intermediários. Se começamos com Gaza, teremos ganho. Penso que toda a região precisa de ver progressos”, disse. A chegada de Trump à Casa Branca e a sua posição pró-Israel é vista por Lapid como “uma incrível janela de oportunidade”. “Sabemos que a estratégia da Autoridade Palestina e do presidente Abbas fracassou.

10. Dizem há algum tempo que não há necessidade de negociar com Israel, que apenas precisam de garantir que a pressão internacional sobre Israel endureça cada vez mais. Mas a nova administração já anunciou que isto não vai funcionar com eles, e penso que Israel, se voltar à mesa de negociações, o fará numa posição de poder que não teve nos últimos anos”, referiu ao Post. Cimeira secreta: Israel recusou acordo de paz regional proposto pelos EUA.

04 de maio de 2017

PERÓN, NA ÉPOCA, COM 75 ANOS! ENTREVISTA: ENSINAMENTOS QUE SERVEM AOS NOSSOS POLÍTICOS DE HOJE!

1. O consagrado escritor argentino Tomás Eloy Martínez, em 1970, com 36 anos, conseguiu que Perón -75 anos e já com 15 anos de exílio- concedesse em sua casa em Madrid (Puerta de Hierro) uma entrevista gravada. Foram 4 dias de gravações. Em base a essa entrevista, Eloy Martinez escreveu dezenas e dezenas de artigos e dois livros de grande sucesso: Santa Evita e A Novela de Perón.

2. Essas fitas, mantidas em caixas, ficaram guardadas até agora. Nos últimos meses foram transformadas em filme e documentário. Dias atrás, antecipando o lançamento, foram divulgadas 5 partes deste documentário, que vão desde a sua infância até sua morte. As respostas de Perón a Eloy Martinez são comentadas por politólogos, historiadores, políticos sêniores e até publicitários.

3. Deveriam ser vistas e revistas por nossos políticos de hoje, pois contêm experiências acumuladas até a sua maturidade. Seguem trechos que este Ex-Blog selecionou.

4. “O líder, primeiro, se faz ver, para que o conheçam. Depois se faz obedecer espontânea e naturalmente para passar a ser percebido como infalível. O que conduz deve ser percebido como infalível. Isso tudo é uma arte.

5. Não sou um político: sou um condutor. Carisma é o produto de um processo técnico de condução.

6. Condução é unificar as ideias dispersas em direção a um objetivo que conhece o condutor.

7. Ao se chegar ao poder se tem 2 objetivos: fazer a felicidade do Povo e a grandeza da Nação. Se se excede em um, se sacrifica o outro. Deve-se conseguir um equilíbrio entre os dois.

8. A política deve ser pendular entre o sindicalismo que está sempre a direita e a esquerda que está na política.

9. A Condução política é sui generis. As pessoas estão acostumadas à gestão da ordem (que de fato é uma gestão militar). Mas em política jamais existe ordem. Há que se preparar e se acostumar a gerir a desordem.

10. A política não pode ser um corpo rígido. Tem que ser flexível.

11. Fui criado com os animais; adoro os animais. Na política há 10% de idealistas e 90% de opiniões dispersas. Estes 10% são como os cães (tenho 4) e 90% como os gatos. Os cães são fiéis e acompanham silenciosamente. Os gatos são dispersos. Saem para caçar à noite. Quando são contrariados preferem ficar num canto e até se ocultar. Mas quando se veem cercados, reagem atacando. São felinos.

12. Estar longe dos fatos é melhor que se estar perto. De longe se vê a totalidade.

13. Comentários finais. Perón sempre teve o controle do movimento peronista. Só perdeu o controle quando voltou do exílio ao governo em 1973. / Erro maior dos peronistas: a Volta de Perón em 1973 não foi para construir um futuro, mas para repetir o passado, dos anos de glória entre 1946 e 1955.

03 de maio de 2017

“FRANÇA: PRIMEIRO TURNO MARCOU O COMEÇO DO FIM DA QUINTA REPÚBLICA, FUNDADA POR DE GAULLE EM 1958”!

Entrevista de Daniel Cohn-Bendit à Folha de S. Paulo (01/05). Cohn-Bendit é uma referência da esquerda europeia desde 1968, quando despontou como um dos líderes do movimento social e cultural que sacudiu a França e o mundo.

1. Não estamos perante o cenário clássico, em que o eleitorado legitimista dá ao presidente eleito uma maioria no Parlamento. A história destas presidenciais só poderá começar a ser contada depois do segundo turno das legislativas. Tradicionalmente, quando dois candidatos de centro direita e esquerda enfrentam um candidato de extrema direita no segundo turno das legislativas, o candidato que estiver atrás nas sondagens desiste para ajudar a barrar a extrema direita [nas eleições para deputados, o segundo turno é garantido. Todos os candidatos com mais de 12,5% dos votos se qualificam automaticamente. Se nenhum atingir essa marca, os dois primeiros colocados se apresentam no segundo turno.

2. Um agravante seria a multiplicação de quadrangulares, ou seja, a qualificação de quatro candidatos para o segundo turno. Isso teria consequências imprevisíveis. Se uma eleição para presidente com quatro favoritos foi complicada, imagine 577 eleições de deputados com quatro finalistas.

3. No social, é possível definir o que é ser de direita e de esquerda. Esquematicamente, a direita defende mais individualismo, e a esquerda, mais solidariedade. Em outros temas, não é assim tão evidente. Na Europa, você tem um nacionalismo de esquerda, e outro de direita. Nos direitos humanos, você pode ser de esquerda como o Jean-Luc Mélenchon, e ao mesmo tempo defender o presidente Nicolás Maduro, da Venezuela. Você é de esquerda quando defende Maduro? Quando Mélenchon e Marine Le Pen se apresentam como pró-Vladimir Putin [presidente russo] e Bashar al-Assad [ditador sírio], onde está a esquerda e onde está a direita?

4. Certo é que o primeiro turno marca o começo do fim da Quinta República [fundada por Charles de Gaulle em 1958], porque os dois partidos que estruturaram a vida política foram eliminados no primeiro turno. Não se trata apenas do fracasso do Partido Socialista e da socialdemocracia, também estamos vendo o colapso da direita parlamentar. Os tapas na mesa de Jean-Luc Mélenchon, Marine Le Pen e Emmanuel Macron fragilizaram totalmente o sistema político.

5. Embora de orientações diferentes, duas formações “movimentistas”, os Insubmissos, de Jean-Luc Mélenchon, e o En Marche!, de Emmanuel Macron, dinamitaram a paisagem política. Resta saber se essa tendência se confirmará nas eleições legislativas. Não fazemos a menor ideia se os eleitores regressarão aos espaços políticos tradicionais ou optarão por continuar sacudindo o espaço político e apoiando os novos movimentos. Essa é uma incógnita que não temos como antecipar. Os nossos instrumentos de análise política são inúteis no cenário atual.

6. O problema do Partido dos Trabalhadores do Brasil, e da socialdemocracia em geral, é que, uma vez no poder, acredita que tudo lhe pertence, que pode fazer tudo. De certa forma, a esquerda no poder contribui para uma despolitização da sociedade. A lição do governo François Hollande é que não se pode prometer tudo numa campanha. A campanha é a explicação pedagógica do possível e do impossível, senão é a desilusão garantida. Hollande teve uma maioria que nenhum presidente teve. Teve a maioria no Congresso, no Senado, e nas regiões. Por que não funcionou? Porque não havia consenso político, não só programático, mas também sobre a necessidade de inovar em situações que ninguém podia antecipar. Nesses casos, a esquerda preferiu se esconder atrás da ideologia e negar a realidade.

02 de maio de 2017

MOBILIZAÇÕES NO DIA 28 MARCARAM O FIM DO SINDICALISMO INDUSTRIAL!

1. Filmes, livros, cobertura da imprensa e ação sindical, durante mais de 100 anos, mostravam as greves como interrupção do trabalho nas fábricas industriais. Os piquetes se concentravam na porta das fábricas. E, por isso, esses eram os focos da cobertura da imprensa, das análises, dos livros e dos filmes.

2. Assim eram as marcas das greves no mundo todo. O dia 1 de maio, como dia do trabalhador, abriu, no século XIX, as lutas pela jornada industrial de 8 horas. Os sindicatos ingleses, desde o século XIX, tinham as fábricas como referência. No Brasil não foi diferente. O martelo das fundições simbolizava a luta sindical, até na bandeira dos partidos comunistas. E nem cabe lembrar da luta nos campos, das ligas camponesas. As grandes propriedades no campo foram também “industrializadas”.

3. O movimento sindical brasileiro e suas lideranças mais destacadas, desde os anos 40, da mesma forma. A greve dos metalúrgicos de 1979, de onde despontou Lula como presidente do sindicato, mobilizava os trabalhadores nas portas das fábricas com aparelhos de som em cima de caminhões e palanques improvisados. Os piquetes e as paralizações das fábricas eram expressas nas imagens, filmes e fotos.

4. O debilitamento do associativismo nos últimos anos como contraponto da emergência do setor de serviços pulverizado por natureza, e das redes sociais, iniciou um processo de “desindustrialização” do movimento sindical, de “desobrerização” efetiva dos sindicatos, com maior expressão e substituição pelos sindicatos de classe média, especialmente das corporações nos serviços públicos.

5. As expressões correlacionadas aos sindicatos de têxteis, metalúrgicos, de petroleiros, da construção civil, ferroviários, rodoviários, portuários, etc., desapareceram das convocações para a mobilização do dia 28 e da cobertura da imprensa. Certamente faltou, na cobertura da imprensa, presença de repórteres –especialmente fotográficos- nas portas das empresas industriais. Se tivessem ido lá, teriam destacado um clima de tranquilidade em todo o parque industrial, como se nada estivesse acontecendo no centro das cidades.

6. A paralização parcial dos transportes públicos teve muito mais a ver com a ameaça de queima de ônibus do que de adesão dos rodoviários. As expressões –sindicato dos marítimos, dos ferroviários…- desapareceram.

7. A própria metodologia/tecnologia das mobilizações na chamada greve geral do dia 28 teve muito mais a ver com a experiência das ruas marcadas pelas redes sociais nos últimos 4 anos, que pelas centrais sindicais. Até a violência usada veio dessas experiências como dos black-blocs.

8. Uma leitura adequada das mobilizações no dia 28 de abril deveria servir para a reflexão dos sindicatos, dos sociólogos, dos políticos e da imprensa.