31 de agosto de 2017

JOVENS POLÍTICOS EMERGEM NA AMÉRICA LATINA!

(Sylvia Colombo – Folha de S. Paulo, 27) 1. A América Latina ostenta um time de presidentes cujas idades lhes garantiria a aposentadoria pela lei de seus países: o peruano Pedro Pablo Kuczynski tem 78 anos; o uruguaio Tabaré Vázquez, 77; o brasileiro Michel Temer, 76; o colombiano Juan Manuel Santos e a chilena Michelle Bachelet têm ambos 65.

2. Enquanto essa geração começa a se despedir do poder, porém, a região vê surgir lideranças à esquerda e à direita que, à beira dos 40 anos, se apresenta como protagonista de uma “nova política”. Alguns disputarão as próximas eleições presidenciais em seus países. Outros preparam terreno para seu voo próprio por trás de candidaturas de líderes mais velhos. Têm em comum, além do vigor natural da idade, a preocupação em não se mostrarem como extremistas.

3. Preferem ser rotulados como centro-esquerda ou centro-direita, têm boa retórica, soam informais, fazem questão de participar de eventos em que exista contato direto com o eleitorado e manejam uma boa estratégia de marketing nas redes sociais. Um dos exemplos é Santiago Peña, 38, candidato à Presidência do Paraguai pelo partido Colorado. “O mundo está mudando, e as sociedades têm buscado candidatos jovens, que demonstrem, além de energia, capacidade de liderança. É o caso de Emmanuel Macron, na França, ou de Justin Trudeau, no Canadá”, disse. “Até aqui, vivíamos uma realidade em que os presidentes chegavam ao cargo no fim da vida, quando é mais difícil promover mudanças, pois a pessoa se torna mais conservadora e sonha menos.”

4. Há países cuja lei impede os jovens de se candidatarem ao principal cargo do Executivo. Além do Brasil, o Chile também impõe uma idade mínima de 35 anos. Até hoje, isso não era problema, pois a maioria dos políticos lançava-se mais tarde. Mas a situação mudou com as manifestações estudantis de 2011, que criaram uma geração s com vocação política, como os hoje deputados Camila Vallejo, 29, Gabriel Boric, 31, e Giorgio Jackson, 30. Destes, Boric seria o mais presidenciável, pois é o segundo político chileno com maior aprovação popular –45%, só perdendo para o direitista Sebastián Piñera, favorito do próximo pleito.

5. Com a impossibilidade de concorrer à Presidência, os membros do grupo formaram a Frente Ampla, conjunto de partidos e agrupações políticas de esquerda que convidou uma jornalista afinada a seus ideais, Beatriz Sánchez, 46, para disputar o pleito em novembro com o ex-presidente Piñera, 67, e o governista Alejandro Guillier, 64. “Nossa aparição no cenário certamente trará a necessidade de discutir a idade mínima”, disse Jackson.

6. Na Colômbia, destaca-se à direita o senador Iván Duque, 41. Apadrinhado pelo ex-presidente Álvaro Uribe, foi uma das principais vozes na campanha pelo “não” no plebiscito sobre a paz com as Farc. “Eu acredito em campanhas que instruam, que expliquem nossos argumentos diretamente ao eleitorado”, diz. Duque ainda enfrentará uma disputa interna, mas sai favorecido porque o favorito da lista de Uribe, Óscar Iván Zuluaga, foi acusado de ter recebido caixa 2 da empreiteira brasileira Odebrecht.

7. No México, que não tem reeleição e escolhe o presidente em 2018, a oposição vem se reorganizando para tentar desbancar o PRI (Partido Revolucionário Institucional) de Enrique Peña Nieto. O direitista PAN (Partido da Ação Nacional) tem tentado mudar sua imagem diante da avaliação negativa da gestão de Felipe Calderón (2006-12), cuja “guerra ao narcotráfico” deixou milhares de mortos. A primeira ação foi escolher como presidente do partido Ricardo Anaya, 38, ex-líder da Câmara de Deputados, e incumbi-lo de apresentar uma agenda mais moderna. Com uma série de atos e uma campanha nas redes sociais, Anaya vem tratando de temas antes periféricos para o PAN, como políticas de gênero e para a juventude. Caberá a ele a decisão final sobre o candidato da legenda. “A política velha e os velhos políticos seguem vendo os jovens como instrumento para alcançar seus propósitos; o PAN de hoje pensa o contrário. Para nós, os partidos e a política devem servir aos jovens”, disse Anaya.

8. Na Argentina, os jovens surgem tanto nas forças estabelecidas como nas novas. No lado do governo, o presidente Mauricio Macri já se transformou em padrinho de novos líderes que podem disputar sua sucessão caso os índices de aprovação da gestão sigam positivos. São nomes como o do todo-poderoso chefe de gabinete, Marcos Peña, 40, e da governadora da Província de Buenos Aires, Maria Eugenia Vidal, 43. Do lado do kirchnerismo, há lideranças do La Cámpora, como Juan Cabandié, 39.

9. Outra novidade é o avanço da jovem Frente de Izquierda, que obteve um desempenho 30% melhor nas últimas primárias em relação à eleição de 2015, fazendo a crítica tanto às políticas de ajuste de Macri quanto à corrupção do kirchnerismo. Seus nomes mais conhecidos são o ex-candidato a presidente Nicolás Del Caño, 37, e a ex-deputada Myriam Bregman, 45. “Há uma demanda dos trabalhadores de indústrias, dos jovens operários, que já não são mais respondidas pelos sindicatos tradicionais. Aí está uma fonte de nosso avanço”, disse Bregman.

30 de agosto de 2017

“PARA A SOCIEDADE ITALIANA OS POLÍTICOS NÃO ERAM MAIS NECESSÁRIOS”!

Da entrevista do historiador Giovanni Orsina, professor da universidade LUISS – Guido Carli, em Roma – Folha de S. Paulo (28).

1. A Itália dos anos 1980 era um mix de tudo isso, elite, classe média, operários. Como disse, em vez de a sociedade se responsabilizar também pela situação, os italianos resolveram colocar toda a culpa nos políticos. Acharam que se você se livrasse de bodes expiatórios, tudo ficaria bem. Apoiaram a Mãos Limpas, só que nada foi plantado exceto a ideia de que a política é ruim, e que os magistrados eram mágicos. Pediam a mudança, mas não aceitavam dar os instrumentos a quem poderia fazê-la. Acabou com o sistema.

2. No caso de Antonio di Pietro [o juiz principal da Mãos Limpas, que virou ministro do governo de centro-esquerda de Romano Prodi em 1996 e de 2006 a 2008]. Houve artigos incríveis escrito por ele e também por outros, nos quais era adotada uma retórica moralista. O indiciamento ético da classe política era moral, não judicial. Tanto que ele apareceu em um programa de TV fazendo café da manhã, um verdadeiro herói do povo. Depois ele viria a fundar um partido, o Itália de Valores [em 1998], cujo nome diz tudo.

3. Em 1994, quando Berlusconi foi eleito, sua figura era a solução para a demanda por moralidade. Ele não era um político, e para a sociedade os políticos não eram mais necessários. E há mais: a sociedade civil julgou que estava na hora de colocar um dos seus, o melhor dos seus integrantes, no poder. Ele nem precisaria roubar, pois era bilionário. E encarnava o trabalho duro, o empreendedor, o “self-made man”. Era uma solução brilhante. Era o filho da revolução, só depois o chamaram de ilegítimo.

4. A Itália nunca ficou totalmente contra Berlusconi. Eu diria que apenas aqueles que eram contra ele já em 1994, estratos da elite e a esquerda, continuam seus adversários. Ele está de volta, está fazendo política e vai influenciar nas eleições de 2018.

5. A Itália nunca se recuperou das Mãos Limpas. O sistema político ficou tão enfraquecido que mesmo um personagem como Berlusconi, acusado de tantas coisas, ainda é um grande ator.

6. A sociedade quis a solução do grande gestor. Mas é importante lembrar que ele não foi eleito só por isso. A falta de alternativas era enorme. Ninguém queria um governo dos pós-comunistas, a esquerda.

7. Naturalmente não posso falar sobre o Brasil, que não conheço bem. Mas a lição que ficou da crise na Itália é uma muito difícil de ser ouvida: a política é uma atividade necessária, tem suas próprias regras e seu próprio tempo. Políticos têm de ser bem pagos para fazer seu trabalho sem desvio, e se você não der os instrumentos, a política falhará. Se ela falha, o campo fica aberto e é povoado por todo tipo de personagem. A Itália não aprendeu a lição.

29 de agosto de 2017

POLÍTICOS PROFISSIONAIS OU NÃO? RENOVAÇÃO OU NÃO?

1. Em dezembro de 1996, quando o prefeito Cesar Maia encerrava seu primeiro mandato, recebeu um telefonema do ex-deputado e ex-ministro Armando Falcão pedindo para conhecê-lo. Foi marcado um almoço na Prefeitura. Cesar Maia, para abrir a conversa e de certa forma agradar o ex-ministro, perguntou por que a qualidade dos parlamentares dos anos 50 era tão melhor que os atuais – daquele momento.

2. Armando Falcão respondeu de bate-pronto. A culpa é de Brasília. Antes da mudança, quando a capital era aqui no Rio de Janeiro, os profissionais de maior qualificação entre os advogados, médicos, engenheiros, etc., de todos os Estados, tinham interesse em se candidatar, pois trariam seus escritórios e suas atividades para o Rio e, muitas vezes, com vantagem.

3. E prosseguiu: Em Brasília os deputados federais passaram a ter que se tornar obrigatoriamente políticos profissionais –dedicados a essa função-, pois não havia mercado para os profissionais de maior qualidade. E, progressivamente, os deputados federais não só se profissionalizaram como tais, como aprenderam outras atividades associadas, como intermediários de lobistas.

4. Em 2001, em seminários na London School of Economics, em que participou, o cientista político Nelson Carvalho acompanhou o debate se os políticos deveriam ser profissionais –com dedicação exclusiva ou quase- ou deveriam associar suas profissões à de deputado. Os argumentos da profissionalização dos políticos terminaram prevalecendo, mesmo que, com isso, num sistema de voto voluntário, a participação dos eleitores presentes às urnas caísse muito. E que a combinação do político profissional com voto voluntário, afunilando a participação do eleitor, poderia ser positiva.

5. O argumento favorável destacava que em qualquer atividade a experiência a torna mais produtiva e mais eficaz. E que amplas renovações dos deputados, produziria um poder legislativo moroso e errático. Olhando as democracias em países mais desenvolvidos, se verifica que a renovação nas Câmaras de Deputados é marginal, os grandes partidos têm estabilidade e quando a proporção entre eles sofre mudanças significativas os novos deputados na maioria são na verdade deputados anteriores. E isso não depende do voto ser distrital ou proporcional.

6. Na maioria dessas democracias em países mais desenvolvidos –europeus ou norte-americanos- a renovação, no sentido exposto, é muito pequena. As mudanças dos personagens ocorrem de forma progressiva, quase etária.

7. Nos Estados Unidos –caso único- o mandato dos deputados federais é de 2 anos, metade do mandato do presidente. Uns anos atrás se fez um levantamento com os deputados federais a respeito, se não achavam melhor um mandato de 4 anos, como nos demais países. A imensa maioria deles respondeu que não. E por quê? Resposta: Porque com mandato curto não dá tempo para outros pretendentes se fixarem “no meu distrito”. Com isso, a probabilidade de permanência e re-reeleição é muito maior.

8. O presidente Macron, com discurso de renovação, atraiu novos candidatos que se tornaram novos deputados. Uma amplíssima renovação. Mas em pouco tempo sentiu que as condições de governabilidade haviam se deteriorado. A maioria dos deputados se sentia independente e não-partidária. Agora, a popularidade de Macron despencou de uns 60% para uns 35%.

9. Neste momento em que se decide sobre a reforma política no Brasil, a experiência de outras democracias desenvolvidas deve servir para a reflexão sobre uma renovação abrupta da Câmara de Deputados. E é provável que a tendência –que se vê- para se manter o sistema atual do voto proporcional aberto (que só o Brasil tem no mundo todo) seja a sensação dos atuais deputados que mantido esse mesmo sistema, o risco da renovação, em relação aos de hoje ou aos de ontem, é muito muito pequeno.

28 de agosto de 2017

PRIVATIZAÇÃO DA CASA DA MOEDA!

Discurso do Vereador Cesar Maia, filho de Felinto Maia que foi diretor da Casa da Moeda por 15 anos durante os anos de 1946 a 1960.

(SR. CESAR MAIA- Câmara Municipal – 24/08/2017) 1. Senhor Presidente, no dia de ontem foi anunciado um conjunto grande de decisões de privatização de órgãos públicos. Entre eles, a Casa da Moeda do Brasil, que me traz memórias muito fortes.

2. Meu pai participou do primeiro concurso profissional da administração pública ocorrido em 1937. Com esse concurso, o Doutor Simões Lopes organizou uma elite de funcionários públicos administrativos e os treinou em Washington, na Hollerith, nome anterior da IBM. Trouxe-os de volta e os foi alocando em órgãos de escolha.

3. Meu pai foi designado diretor da Casa da Moeda, em 1946. Fundada em 1694, durante muito tempo – séculos XVIII, XIX e XX, até o Golpe de 1964 –, a Casa da Moeda era uma diretoria da Fazenda Nacional. A Sumoc, Superintendência da Moeda e do Crédito, e a Casa da Moeda, depois do Golpe de 1964, tiveram suas funções monetárias fundidas, e foi criado o Banco Central. Funcionava no Campo de Santana, onde hoje é o Arquivo Nacional.

4. Aliás, aconteceu um fato bastante curioso. O governo chileno pediu um projeto do palácio de governo, e o Brasil pediu um projeto para a Casa da Moeda. Estou falando de metade do século XIX. E esses envelopes foram trocados. Para o Chile, foi o projeto da Casa da Moeda. Por isso, no Chile, o palácio presidencial chama-se La Moneda, e o que veio para o Brasil foi o projeto do palácio presidencial do Chile. Daí aquele prédio vistoso, com os dois leões, que representam a autoridade maior, e a escadaria na frente da Casa da Moeda. Meu pai foi diretor da Instituição durante 15 anos. Junto com a Sumoc, ela tinha funções de Banco Central. Também era lá que se cumpriam todas as funções mais sofisticadas de investigação de assinaturas de documentos.

5. Meu pai saiu em 1960, no final do Governo JK. Foi diretor durante os governos dos Presidentes Dutra, Getúlio Vargas e Juscelino. Neste último, acumulou funções do grupo de trabalho de Brasília. A criação de Brasília teve duas direções: a de obras, que foi comandada pelo Doutor Israel Pinheiro; outra de transferência da administração pública. E meu pai, Felinto Epitácio Maia, dirigiu o grupo de trabalho de Brasília. Em 1960, os órgãos tinham que estar alocados e os funcionários com seus aparatos funcionais também definidos.

6. Depois, com a criação do Banco Central, em 1965, a Casa da Moeda passou a ser uma autarquia. Assim foi. Finalmente, em 1973, transformou-se em empresa pública.

7. A Casa da Moeda teve batalhas da maior importância. Houve uma sobre quem fornecia as notas. Ela produzia as moedas mas quem produzia as notas eram o American Bank Notes e Thomas de La Rue. Quando o Presidente Getúlio Vargas e, em seguida, o Presidente Juscelino Kubitschek autorizaram a Casa da Moeda a adquirir tecnologia para produzir as notas, foi uma espécie de guerra, com resistência e um combate intenso. Houve muita pressão com relação a isso. Terminou que meu pai foi correr a Europa para comprar máquinas para produzir as notas aqui ; nem todos os países queriam fornecer essas máquinas. Finalmente, o Brasil comprou da Itália.

8. Colocadas, começaram a produzir. E pela primeira vez, acho que na América Latina, um banco próprio, nacional, produzia as notas. A primeira nota foi a de cinco cruzeiros, na qual havia a esfinge de um índio. Finalmente foi superada essa fase e a Casa da Moeda começou a emitir outras notas.

9. O fato é que com o Golpe de 64, com a transformação em autarquia e depois em empresa, o deslocamento da Casa da Moeda do Campo de Santana, do edifício onde é hoje o Arquivo Nacional, Histórico, para Santa Cruz, ela passou então a funcionar como empresa. Isso, por um lado, causou avanços tecnológicos, é natural, mas, por outro lado, houve a debilitação da sua função pública e a perda da sua referência histórica.

10. A decisão hoje de privatizar a Casa da Moeda ocorre porque ela deixou de cumprir aquelas funções públicas e passou a ser uma fábrica de valores, de papel moeda, mas também de passaportes, de documentos, e com essa debilitação de suas funções públicas, terminou deixando de ser importante na estrutura do Ministério da Fazenda. É apenas um órgão acoplado ao Ministério da Fazenda. Deixou completamente a sua função de autoridade monetária em conjunto com a Sumoc.

11. Eu não podia deixar de fazer esse comentário porque, muitas vezes, decisões tomadas 44 anos atrás, 34 anos atrás, vão terminar produzindo um debilitamento de tal ordem que deixa de ser importante esse órgão que virou empresa e está sob o comando do Poder Público. Agora virá a privatização. Nós tivemos também, nesses últimos anos, nomeações de diretores da Casa da Moeda obedecendo ao rito da clientela. Houve casos bastante delicados que a imprensa divulgou de forma bastante ampla.

12. Era o comentário que eu queria fazer. Com memória e com tristeza.

25 de agosto de 2017

HIPÓTESES DO CRESCIMENTO RECENTE DA VIOLÊNCIA E DA CRIMINALIDADE NO RIO!

1. Supondo que o vetor orientador da criminalidade é aquele que explica a maior rentabilidade entre todas as modalidades, há que se perguntar que vetor é este e o que pode ter afetado a lucratividade deste vetor. É claro que não há um só vetor, mesmo que o principal se destaque, até porque a lucratividade é agregada, ou seja, soma diversas modalidades.

2. Mas quando a principal modalidade é afetada, a busca de compensações em outras modalidades –especialmente quando estas não são concentradas- gera um espalhamento e exponencia a sensação de insegurança.

3. No final de 1994 e início de 1995, a perda de controle da segurança pública no Rio de Janeiro sobre a criminalidade levou a uma intervenção do Exército com ocupação contínua de várias comunidades. O sufoco dado no tráfico de drogas fez o crime “vir para o asfalto” e a criminalidade de rua –assaltos de todos os tipos- cresceu vertiginosamente.

4. A repressão de contato feita pelo exército levou a uma autocrítica por duas razões: a) o exército é treinado para ocupar o território inimigo e para liquidar a força oponente, o que não é caso de comunidades cujo território é municipal e a imensa maioria dos moradores quer paz e torcia pela sucesso do exército. b) a repressão de contato aumenta em muito o risco de contaminar os que reprimem, como mostra a experiência em outros países, como o México.

5. O Exército saiu e a alternativa foi trocar o secretário de segurança e iniciar um ciclo altamente repressivo por parte das forças policiais, com significativo aumento da mortalidade dos delinquentes, acuando o tráfico de drogas e a criminalidade. Com isso, ocorreu um refluxo em relação aos chamados crimes de rua. E o tráfico de drogas voltou a liderar as modalidades e retornar às comunidades que serviam de base a seu mercado.

6. Agora –outra vez- numa curva que cresce e depois exponencia, a partir de fins de 2015, há um descontrole na segurança pública e um aumento da violência e da criminalidade. O secretário de segurança, como se pudesse ter previsto, programa sua saída depois dos JJOO e de um ciclo de exaltação de ações de segurança pública de uma nota só, com as chamadas UPPs.

7. E mais uma vez o Exército é chamado a entrar nesse processo, reprimindo e inibindo a criminalidade fora de controle. Mas a experiência de 1994/1995 levou a que o exército não repetisse –agora- o erro de 1994/1995, quando ocupou comunidades numa repressão de proximidade, como se fosse polícia, sem o ser.

8. E volta a pergunta inicial: o que mudou no perfil da criminalidade para ter deflagrado esse novo processo de descontrole e espalhamento?

9. A hipótese com que alguns especialistas trabalham é que o vetor principal –ou orientador- da criminalidade no Rio –o tráfico de drogas e em especial de cocaína- foi afetado e debilitou-se, seja por razões de demanda, seja por razões de oferta.

10. De DEMANDA em função da crise econômica, reduzindo o poder de compra dos consumidores e dos repassadores diretos. E empurrando a maior taxa de desemprego dos jovens a buscar alternativas. De OFERTA pela maior efetividade da repressão ao tráfico de drogas nas fronteiras e nos corredores, até o mercado distribuidor –o narcovarejo.

11. Isso produz três efeitos. Primeiro, o acirramento e radicalização pelo controle dos pontos mais lucrativos do narcovarejo, desequilibrando áreas como Rocinha, Maré, Alemão, Jacarezinho, Rolas…, entre outras. E desintegrando as UPPs. Segundo, a busca de novas modalidades compensatórias, como o caso do roubo de cargas. Terceiro, desconectando as pontas do varejo, da estrutura das “bocas de fumo”, lançando os “aviões, olheiros e fogueteiros” no crime de rua, inclusive com armas brancas.

12. Se estas hipóteses são efetivas, o problema é similar ao de 1994/1995, só que agora em muito maior dimensão, em função dos fatos narrados nos itens 10 e 11. Se é fato que a repressão no atacado tem produzido melhores resultados, esta é uma boa notícia. Mas sua articulação com a estrutura dos crimes deveria ter levado as polícias a se organizarem para enfrentar as novas situações que vieram como desdobramento.

13. E –sendo assim- há que redesenhar o perfil da segurança pública, de forma a enfrentar as novas situações criadas de fora para dentro. Ou seja, se a razão de origem desse novo quadro não é o fracasso da polícia, o fato é que a partir do novo desenho do crime e da falta de antecipação, compreensão e agilidade para enfrentar este novo momento, a responsabilidade passa a ser alocada à polícia.

14. E o Exército e as forças federais darão uma enorme contribuição conhecendo bem este novo momento, estes novos perfis conjunturais, e atuando de forma complementar e interativa com as polícias, inibindo os poros que foram abertos pelas circunstâncias. Por isso, não é figura de retórica quando o secretário de segurança afirma que a polícia está sangrando e a sociedade está sangrando, figura que ajuda a entender que esses sangramentos não serão contidos por simples bandagens.

24 de agosto de 2017

DROGAS: NOVOS CAMINHOS NA AMÉRICA DO SUL!

(Clóvis Rossi – Folha de S. Paulo, 20) 1. Informa a Reuters que um novo ponto quente de produção de cocaína está se firmando no Peru, nas proximidades da fronteira com Brasil e Colômbia. A informação é do ministro peruano da Defesa, Jorge Nieto. Complementam Robert Muggah e Katherine Aguirre, do Instituto Igarapé, precioso centro de estudos sobre a violência: o fato de a Colômbia ter posto fim ao conflito com as Farc (Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia) não significa que a violência no país diminuiu em todas as áreas.

2. Em algumas delas, abandonadas pelas Farc, entrou, por exemplo, o Clã do Golfo, considerada a maior organização ilegal do país. Essas informações mostram a necessidade de monitorar as fronteiras, porosas às drogas e, por extensão, à violência a elas inexoravelmente associada. Basta saber que Peru e Colômbia são os dois maiores produtores de cocaína e que o plantio de coca na fronteira Brasil-Colômbia triplicou para cerca de 20 mil hectares nos anos recentes, segundo a Comissão Nacional para o Desenvolvimento e a Vida sem Drogas (Peru).

3. O Brasil está monitorando uma outra fronteira (com o Uruguai) para avaliar o efeito que nela terá o esquema de regulação para a produção, distribuição e venda legal de cannabis. Ou, posto de outra forma, demonstra interesse em um esquema completamente diferente da guerra às drogas que vigora no resto do mundo, Brasil inclusive. É cedo demais para que o monitoramento produza conclusões definitivas, ainda mais agora que o programa uruguaio chegou a um ponto crítico, que ameaça o seu prosseguimento.

4. A banca uruguaia, inclusive o estatal Banco República, nega-se a permitir que as farmácias inscritas para a venda (legal) da droga tenham contas, proibição que se estende aos cultivadores (também legais). Alega que os bancos locais ficariam impossibilitados de fazer qualquer operação internacional porque seus correspondentes no exterior estão proibidos de trabalhar com quem receba dinheiro proveniente da droga.

5. Abriu-se, com isso, uma tremenda crise, a ponto de o ex-presidente José Mujica, em cuja gestão se gestou o esquema de regulação, estar ameaçando travar qualquer votação no Congresso se não houver uma definição. O MPP (Movimento de Participação Popular), que Mujica lidera, é a corrente mais forte da governista Frente Ampla.

6. Um observador externo, o brasileiro Alexandre dos Santos Cunha, pesquisador visitante em políticas sobre drogas na Universidade da República em Montevidéu, dá uma ideia precisa do tamanho do problema: “A implementação da venda em farmácias seria relevante para expandir o mercado regulado legal aos cerca de 100 mil usuários eventuais de cannabis, que não teriam porque cultivá-la, e dos quais 12.460 já estão registrados”.

7. Acrescenta: “É o ponto mais delicado do processo de regulação, pois nunca é simples criar um mercado, principalmente para uma substância cujo modelo de negócios é bastante pouco conhecido”. Minha opinião: parece óbvio que o Brasil deveria ter todo o interesse em que prevaleça o modelo uruguaio, ora ameaçado. A alternativa é o Clã do Golfo.

23 de agosto de 2017

OS 10 PAÍSES QUE CONCENTRAM 75% DOS ATAQUES TERRORISTAS NO MUNDO!

1. Os dois atentados na Espanha – em Barcelona e horas depois no balneário de Cambrils, na região da Catalunha – mais uma vez voltaram a atrair as atenções do mundo para a Europa. Desde o início deste ano, ataques desse tipo já deixaram mais de 50 mortos e centenas de feridos no continente. Além da Espanha, Reino Unido e Suécia também foram alvo de ações extremistas.

2. Mas isso quer dizer que a Europa se tornou o novo foco do fanatismo global? As estatísticas mais recentes publicadas pela base de dados Global Terrorist Database mostram que não. Ataques com motivações políticas, sociais ou religiosas e com grande número de mortos são relativamente raros no continente. De janeiro a dezembro do ano passado, os atentados fatais no Ocidente representaram somente 2,5% de todos os que cumpriram os seguintes requisitos: – Ter tido motivações políticas, sociais ou religiosas. – Ter sido concebido para gerar o maior potencial de estragos. – Não ter acontecido durante guerras internacionalmente reconhecidas

3. A conclusão foi de que, no ano passado, das 34.623 pessoas que morreram vítimas de ataques segundo tais critérios, 71% das mortes se concentraram em quatro países: Iraque, Afeganistão, Síria e Somália. É provável que poucos se lembrem do atentado ao distrito de Karrada, Bagdá, que deixou 382 mortos durante o Ramadã, o mês sagrado para os muçulmanos, no ano passado, o mais letal de 2016. A cifra é mais do que o dobro do total de mortos dos ataques de Bruxelas, Nice e Berlim somados (134, incluindo os autores).

4. “Esses ataques (no Ocidente) continuam sendo uma minoria, uma pequena minoria dos ataques que vemos”, diz Erin Miller, diretora de programas da Global Terrorism Database. “Obviamente, acabam recebendo muita atenção porque são atípicos e viram manchetes, enquanto que o Oriente Médio é esquecido”, acrescentou ela.

5. De fato, as estatísticas compiladas por esta iniciativa do Consórcio Nacional para o Estudo do Terrorismo e Reações ao Terrorismo – um “centro de excelência” do Departamento de Segurança Interior do governo dos Estados Unidos localizado na Universidade de Maryland – reforçam que a maior parte desses ataques é realizada longe dos nossos olhos.

6. De acordo com os dados, 75% de todos os “ataques terroristas” registrados no mundo se concentraram em dez países: Iraque, Afeganistão, Índia, Paquistão, Filipinas, Somália, Turquia, Nigéria, Iêmen e Síria. E pelo menos, segundo uma especialista, esse total pode estar subestimado, pois a Global Terrorism Database exclui sistematicamente os incidentes que não são noticiados pela imprensa.

7. “Os números variam muito dependendo de onde os dados são obtidos e em qual idioma”, diz Mia Bloom, professora de comunicação da Universidade do Estado da Geórgia, nos EUA. A base de dados é alimentada principalmente por notícias em inglês assim como traduções de meios de comunicação estrangeiros viabilizados pelo Open Source Center – ligado à CIA, a agência de inteligência americana. Seja como for, o certo é que, em 2016, o Iraque foi de longe o país que mais sofreu com o terror, registrando 35% das mortes por ataques a nível mundial: 33 todos os dias, em média.

8. E seis dos dez ataques mais letais também ocorreram ali, todos reivindicados pelo grupo autodeclarado Estado Islâmico. A organização extremista também foi a mais ativa globalmente, com um total de 1.430 ataques. No Afeganistão, contudo, também opera o Talibã; na Nigéria, o Boko Haram, e na Somália, o Al-Shabaab, entre outros grupos.

9. Mas nem todos os ataques classificados como terroristas são protagonizados por organizações islâmicas. Grupos separatistas como o PKK e o Exército de Liberação do Baloquistão foram responsáveis por ataques em dois países do Top 10, respectivamente Turquia e Paquistão. E o terceiro lugar (em número de ataques, não de mortes) ocupado pela Índia é decorrente, em boa parte, dos 126 atentados com bomba realizados no ano passado por grupos maoístas.

22 de agosto de 2017

EXPLICANDO O VOTO NOS DEPUTADOS, NA LEGENDA DOS PARTIDOS, NO BRASIL!

1. Quando foi levantada a hipótese do Distritão vir associado ao voto na legenda partidária, que se chamou de Distritão Misto, as análises sobre as vantagens e desvantagens para os partidos ganharam destaque. As mais comuns afirmam que os Partidos que, nas pesquisas nacionais de opinião, são destacados como os da preferência dos eleitores, levariam vantagem.

2. Na verdade não é assim. Numa série de eleições, os votos na legenda para deputados estaduais e federais foram analisados para se entender as razões. O que se viu é que os votos nas legendas partidárias nas eleições de deputados estaduais e federais, acompanham sempre a importância dos votos nos candidatos a governador.

3. E observou-se que não se trata de uma vinculação orgânica e até esperada. O que se viu é que uma grande proporção dos eleitores chega à urna sem ter seus candidatos a deputados estaduais e federais definidos. As campanhas eleitorais exaltam as candidaturas a governador e, claro, seus números, pois é assim que o eleitor vota.

4. O eleitor chega à urna com o número de seu candidato a governador gravado. A legislação, para evitar uma enorme quantidade de votos brancos e nulos para deputados, determina que primeiro o eleitor marque o número de seu candidato a deputado estadual e em seguida de deputado federal. Depois vem o de senador, governador e presidente.

5. O que se comprovou é que parte dos eleitores, ao chegar na urna sem estar fixado em seus candidatos a deputados e ver aparecer na telinha o voto para deputado estadual, tende a marcar o número de seu candidato a governador automaticamente. E “confirma”. Em seguida, aparece o voto para deputado federal. E outra vez marca o número de seu candidato a governador. E “confirma”.

6. Com isso, as legendas mais votadas para deputados são sempre as dos candidatos a governador mais destacados, líderes nas pesquisas e com maior proporção de votos. As legendas mais simpáticas ao eleitor nas pesquisas nacionais anteriores ajudam alguma coisa, mas não explicam as razões para este ou aquele partido ter uma maior ou menor quantidade de votos na legenda para deputado estadual e federal.

7. Dessa forma, a vantagem que se possa ter nas eleições proporcionais no voto na legenda, sempre –e agora também seria, no Distritão Misto- é ter um candidato majoritário puxador dos votos e cujo número exaltado na propaganda,está bem fixado na memória do eleitor.

8. Sendo assim, o que os candidatos a deputados estaduais ou federais devem buscar é que seu partido tenha um candidato a governador competitivo, pois é ele que induzirá os eleitores ao voto na legenda – por equívoco na digitação específica.

21 de agosto de 2017

A “JUDICIALIZAÇÃO DA POLÍTICA” SÓ PODERIA DAR NA “POLITIZAÇÃO DA JUSTIÇA”!

1. Os políticos têm reclamado muito das intervenções e decisões antecipadas de ministros do STF, procuradores e juízes na política, especialmente no parlamento. Mas este é apenas um desdobramento da ação dos próprios políticos.

2. A cada vez que uma lei é aprovada e que contraria a opinião dos que perderam a votação, imediatamente os perdedores vão aos microfones e à imprensa anunciar que estão recorrendo à Justiça, ao Supremo ou ao Ministério Público contra essa decisão. Correm ao STF cercados de repórteres e câmeras. E brilham nos telejornais.

3. E, naturalmente, juízes e procuradores decidem ou opinam em cada caso. A isso se chamou de “judicialização da política”. Ou seja, os políticos transferindo seu poder de decidir à justiça. E não se trata de casos isolados, mas de procedimentos sistemáticos e rotineiros por qualquer fato.

4. Com isso, a imprensa passou a conhecer a opinião de ministros superiores, juízes e procuradores antes das tramitações de leis e decisões serem definidas. Afinal, vença quem vencer, o recurso à justiça ou ao MP será inevitável nas questões maiores ou menores.

5. O tradicional era que esses recursos à justiça ocorressem contra atos do executivo, questionando sua competência e constitucionalidade. Mas depois, e cada vez mais, os recursos passaram a ser pelo litígio em torno de leis decididas dentro do próprio parlamento, portanto, entre os políticos e partidos.

6. Um tempo atrás, quando os magistrados eram acionados pela imprensa sobre leis em tramitação, sempre respondiam que não podiam se antecipar aos fatos e que só opinariam nos autos depois das leis serem aprovadas e os recursos apresentados com suas razões.

7. Na medida em que -por exclusiva culpa dos próprios políticos- a política foi judicializada, os magistrados -naturalmente- passaram a opinar fora dos autos, pressionados pela imprensa, já que esse caminho será o caminho a ser percorrido após a votação dessa ou daquela lei. A chamada reforma político-eleitoral é apenas um exemplo em destaque.

8. Com isso, a judicialização da política inverteu-se e passou a ocorrer a “politização da justiça”. Se isso, antes, ocorria eventualmente, agora passou a ocorrer sistematicamente. A imprensa fica de plantão na porta do STF e acossa um ministro ao descer de seu carro, pressionando por sua opinião.

9. E até uma palavra, um sorriso ou uma cara feia passam a ser a opinião dos ministros. E além dos jornalistas especializados nos bastidores políticos, no parlamento, nas residências, nos restaurantes e nos lugares públicos, agora os mais prestigiados nos telejornais, nos sites e nos blogs, passaram a ser os especializados nos bastidores do judiciário.

10. Uma inevitável consequência do pecado original dos políticos. Como se diz no ‘cancioneiro’ popular: era Missa Anunciada.

18 de agosto de 2017

O DESGASTE DA IMAGEM DE MACRON!

1. “Desbotado” é o adjetivo que o Le Figaro usa para definir o estado de graça de Emmanuel Macron depois de cem dias no Palácio do Eliseu. A avaliar pelas sondagens, a cor já está mesmo bastante desbotada. Um estudo da Ifop mostra que apenas 36% dos franceses estão satisfeitos com o presidente. Por esta altura, o seu antecessor François Hollande ostentava 46% de taxa de aprovação.

2. Macron conseguiu algo que parecia impossível. No ano passado, por esta altura, ainda era ministro da Economia do governo Manuel Valls, ao mesmo tempo que Hollande ia se arrastando nos últimos meses de presidência, carregando nos ombros uma taxa de aprovação que caíra para mínimos históricos. Perante o descalabro dos socialistas franceses nas intenções de voto, tudo apontava para que o futuro presidente viesse a ser o candidato da direita tradicional. Mas em maio, nove meses depois de deixar a pasta da Economia, Macron, posicionando-se no centro do espetro político, chegou ao Eliseu. E em junho, ainda em lua de mel com os franceses, o seu La République en Marche! conseguiu a cereja para colocar em cima do bolo: a maioria absoluta nas legislativas.

3. Depois de escolher para primeiro-ministro Édouard Philippe (ex-membro d’Os Republicanos) e de nomear um governo com elementos dos vários quadrantes políticos, paritário entre homens e mulheres e com quase 50% de ministros vindos da sociedade civil, Macron começou a governar e a tomar decisões, algumas impopulares, como o aumento da Contribuição Social Generalizada para o financiamento da Seguro Social.

4. Com vontade de mostrar serviço, não perdeu tempo para fazer passar no Parlamento duas das suas promessas emblemáticas – uma lei sobre a moralização da vida pública, que impede a contratação de familiares, e outra que autoriza o governo a fazer alterações no código de trabalho. A primeira acabou por fazer ricochete, uma vez que era intenção do presidente oficializar o estatuto de Brigitte Macron, a sua mulher, como primeira-dama francesa. Perante as críticas e uma petição assinada por mais de 275 mil franceses, Brigitte Macron acabou por ficar sem o estatuto de primeira-dama e sem orçamento próprio.

5. “Emmanuel Macron saiu do estado de graça para reentrar na atmosfera e assumir o custo político das suas decisões”, sublinha, citado pelo Le Figaro, Jérôme Fourquet, politólogo da Ifop. Segundo o estudo realizado pela referida empresa de sondagens, a opinião dos franceses sobre a evolução na França também é reveladora de um clima de fim de lua de mel. Apenas 23% acreditam que a situação do país está a caminho de melhorar. É verdade que, por esta altura do campeonato, em 2012, com Hollande, o número era ainda mais baixo: 17%. Mas com Nicolas Sarkozy, em 2007, a percentagem de otimistas ascendia a 45%.

17 de agosto de 2017

AS DELAÇÕES E AS COMPENSAÇÕES!

(Editorial do Estado de S. Paulo, 16) 1. Que o empresário Joesley Batista fez um negócio da China ao delatar o presidente Michel Temer em troca de total imunidade para os muitos crimes de corrupção envolvendo políticos, empresários e funcionários que confessou ter cometido, todos já sabiam. Agora, porém, surgem suspeitas de que Joesley e os executivos de sua empresa, a JBS, fizeram a bombástica delação também com o objetivo de ficarem livres de punição por supostas fraudes cometidas nos investimentos bilionários que o conglomerado recebeu do BNDES.

2. Essa mutreta, se comprovada, reforça a sensação de que o instrumento da delação premiada, aplicado apressadamente por setores do Ministério Público, não tem servido apenas para esclarecer crimes e desmontar quadrilhas, mas também para livrar criminosos da prisão, enquanto dá a falsa impressão de que a corrupção está sendo combatida.

3. O novo caso envolvendo Joesley Batista foi revelado pelo procurador Ivan Marx, do Ministério Público Federal em Brasília. Responsável pela Operação Bullish, que investiga fraudes na concessão de aportes do BNDES, Marx disse que foram detectados problemas em contratos com a JBS que resultaram em perdas de mais de R$ 1 bilhão. A JBS, como se sabe, foi uma das empresas mais beneficiadas pela política de incentivos aos “campeões nacionais” levada a cabo nos governos de Lula da Silva e de Dilma Rousseff. Entre 2005 e 2014, recebeu nada menos que R$ 10,63 bilhões do BNDES, transformando-se, da noite para o dia, na maior empresa do mundo no segmento de carne processada.

4. Em sua delação, os executivos da JBS informaram que em 2005 a empresa pagou propina para o então presidente do BNDES, Guido Mantega, para que este atuasse em favor da companhia. Afirmam, porém, que não houve fraude na análise técnica para concessão dos recursos, ou seja, embora Joesley tenha dito que os aportes do BNDES não sairiam sem a propina paga a Mantega, os delatores afirmaram desconhecer qualquer irregularidade.

5. O procurador Ivan Marx, no entanto, diz que as investigações apontam crime de gestão temerária nos processos favoráveis à JBS. “O BNDES não fez isso sozinho. Foi sempre por demanda deles (JBS)”, declarou Marx, acrescentando o que, a esta altura, começa a ficar óbvio: “Os executivos (da JBS) vão lá, fazem uma delação, conseguem imunidade e agora não querem responder à investigação”. O procurador informou que vai apresentar denúncia contra os executivos da JBS independentemente do acordo que a Procuradoria-Geral da República fez com Joesley Batista e seus acólitos.

6. Essa situação evidencia que as delações premiadas se transformaram em um bom negócio. Em vez de se prestarem a orientar investigações, as colaborações têm servido para livrar criminosos e até ocultar crimes, como no caso da JBS, desde que se entregue o que certos procuradores desejam – nomes graúdos da política. Parece estar em curso uma espécie de certame entre delatores em potencial, cuja colaboração só será considerada válida se dela constarem os nomes do presidente da República ou, na pior das hipóteses, de algum de seus ministros mais importantes.

7. É evidente que esse procedimento deslegitima o instrumento das delações premiadas, monopolizadas pelo Ministério Público como se fossem parte da acusação, e não da investigação. Essa distorção explica o entrevero ora em curso entre o Ministério Público e a Polícia Federal no que diz respeito às delações.

8. A Procuradoria-Geral da República entrou com ação no Supremo Tribunal Federal para questionar os artigos 2.º e 6.º da Lei 12.850/2013, que atribuem a delegados de polícia o poder de realizar acordos de delação. Para o procurador Carlos Fernando dos Santos Lima, da força-tarefa da Lava Jato, a prerrogativa de fazer acordos de delação é do Ministério Público, pois “só o Ministério Público pode acusar”. Já o diretor da Polícia Federal, Leandro Daiello, lembrando o óbvio, disse que a colaboração premiada é apenas “um instrumento de investigação”. Ou seja, não se pode tratar a delação como base da acusação, pois isso não apenas distorce a natureza desse instrumento, como confere ao delator uma importância desmesurada, e que acaba justificando prêmios igualmente desmedidos.

16 de agosto de 2017

BRASIL: “LUCRO DE FUNDADOR” E “PONTO FUTURO”! QUEM APOSTAR, GANHARÁ!

1. O economista austríaco Rudolf Hilferding (1877-1941), autor do clássico “O Capital Financeiro”, introduziu o conceito de “lucro de fundador”, ou seja, daquelas cujas previsões apontam seus investimentos para um cenário futuro que finalmente se confirma. O treinador de futebol Claudio Coutinho (1939-1981) introduziu o conceito de “ponto futuro”, ou seja, que os jogadores que fazem e recebem os passes não devem se fixar nas posições num certo momento, mas nos espaços vazios para onde devem se deslocar ou lançar seus passes.

2. A cada dia fica mais claro –e todos os indicadores, tendências e cruzamentos econômicos sobre previsibilidade mostram- que a economia brasileira entrou numa curva sustentável de crescimento. A dúvida que pode existir é sobre a aceleração que terá.

3. A taxa de inflação despencou e o salário real cresceu 3% e o nominal 7,4%. A indústria e o comércio interromperam o ciclo de queda. O risco-Brasil, que um ano atrás estava em mais de 450 pontos, hoje está abaixo de 200 pontos, com tendência de queda, permitindo projetar a recuperação do grau de investimento assim que a reforma da previdência for aprovada.

4. A votação da denúncia contra Temer mostrou que o piso de apoio parlamentar que o governo tem (no pior momento) é de 55%, maioria absoluta próxima à maioria constitucional, incluindo os votos do PSDB e outros, pela reforma da previdência. A reforma trabalhista foi aprovada com o mínimo de turbulência, estimulando o emprego, cuja taxa de ocupação já é crescente.

5. A PEC do teto de gastos foi uma medida de corte monetarista que habilmente o governo apresentou como medida fiscal. Afinal, o déficit fiscal ou é financiado pelo aumento da dívida pública ou pelo aumento da emissão. Até nesse sentido a necessidade de alguma flexibilidade fiscal, neste momento, aponta positivamente através de um keynesianismo discreto.

6. O índice de incerteza da FGV, correlacionado com o PIB, mostra que sua provável redução para o nível do início de 2014 terá um efeito de pelo menos 2 pontos no PIB. As projeções para o quarto trimestre de 2017 já mostram que a média até aí, de 0,3%, nesse trimestre isolado, já indicam um crescimento de 1,6%.

7. A correlação entre o crescimento de PIB e a criação de empregos formais é total, e este já cresce há 4 meses seguidos. O balanço de pagamentos acumula superávit de US$ 16 bilhões nos últimos 12 meses e o saldo comercial de U$ 62 bilhões. O problema fiscal é agravado pela queda real das receitas, que devem se recuperar com o crescimento mais acentuado do PIB.

8. A dedução da avaliação de Temer pelos mesmos critérios eleitorais, que mostram a importância do ótimo+bom, não se aplica à avaliação de governo e potencial projetado com outros indicadores. Para tanto, ao ótimo+bom deve se agregar o regular. Nesse sentido, a plataforma de lançamento da avaliação do governo é de 26%, segundo o Ibope-CNI de julho. Isso pode ser visto analisando as curvas de ótimo+bom e do PIB no tempo.

9. A partir de 2017 há um descolamento e a taxa de ótimo+bom não tem reagido com melhoria mesmo que suave do PIB e do emprego. Na medida em que o índice de incerteza diminua, a tendência será a convergência entre PIB e avaliação do governo. Isso não quer dizer que o presidente tenha chances eleitorais, até porque ele já afirmou que não pensa em ser candidato. Mas a avaliação ótimo+bom+regular estará em 50% ou mais no final de 2018, acelerando a recuperação econômica. Resta a imprevisibilidade sobre o grid de largada dos candidatos a presidente.

10. (Miriam Leitão – Globo, 12) 10.1. A economia mundial vive seu melhor momento em muitos anos, desde que a crise financeira abalou os EUA e ameaçou a existência da zona do euro. As projeções do PIB mundial estão altas, a inflação está baixa, e a elevação dos juros americanos deve ser mais lenta. O dólar, que se fortalecia, parece ter mudado a tendência. Isso favorece os preços das commodities e ajuda países emergentes como o Brasil.

10.2. Não é por falta de ajuda externa que o Brasil permanecerá em crise. O PIB mundial deve ter este ano e no próximo os melhores números desde 2011. Ninguém fala mais em risco de colapso do euro, a China tem atingido suas metas de crescimento, e, nos EUA, Trump provoca perturbação política, mas o país tem conseguido crescer, gerar empregos e manter a inflação baixa. É com esse pano de fundo que o economista-chefe para América Latina do banco francês BNP Paribas, Marcelo Carvalho, analisa as perspectivas para o Brasil. — O cenário externo favorece.

15 de agosto de 2017

ESTADO DE S. PAULO (14), ENTREVISTA CESAR MAIA SOBRE O QUADRO NACIONAL!

ESP: A mosca azul de ver seu filho presidente não picou o sr.? Quais foram os motivos que levaram o sr. a aconselhá-lo a ficar ao lado do presidente Temer?

R: Rodrigo não é mais meu filho. Eu é que sou o pai dele. Eu não aconselhei. Eu concordei. Aquilo que a imprensa disse, que Rodrigo articula parado, é espetacular. Não teve mosca azul nenhuma. Pergunta lá quantas vezes eu fui a Brasília, na residência oficial da Câmara dos Deputados ou no gabinete dele. Nenhuma.

ESP: Ele veio ao Rio no momento mais crítico da crise, acompanhado de Mendonça Filho (então deputado, hoje ministro da Educação), no momento em que o DEM quase desembarca.

R: Mendoncinha teve comigo e com o Rodrigo uma vez. Mas eu não sou um personagem ativo nesse processo. Sou um opinador, um comentarista. Lembro que quando a coisa ficou forte, quando familiares e amigos já começaram a achar que ele já era o presidente, mandei um WhatsApp para ele com apenas uma palavra bem grande, em tipo alto: HUMILDADE. Acho que foi o único conselho que dei nesse processo todo. E ele me respondeu: ‘Pai, pode ter absoluta certeza que vai ser assim. Fique tranquilo’.

ESP: Em que momento foi isso?

R: Foi naquele momento em que já era dado como certo que ele assumiria. Teve um movimento ali, dez, 15 dias antes da votação, quando o assunto era tratado como se fosse uma realidade. Eu achava que era um erro substituir o presidente. Aquela votação foi um erro para o Brasil. Porque no momento daquela impulsão do Janot e a recepção do Fachin, a reforma da Previdência estava no forno. Era só colocar para votar. Na hora que entra o caso fica a dúvida: quem será o presidente? Isso esfriou.

ESP: Mas Rodrigo, que era a opção para a substituição de Temer, é a favor da reforma.

R: Ele lidera esse processo. E aí com esse problema que teve, a reforma passou a ser submetida a um crivo de negociação interna. Porque, se me perguntar quem é o responsável pelo fortalecimento do Centrão, eu respondo: Janot e Fachin, que entregaram ao Centrão uma peça de negociação que não tinha.

ESP: O Centrão já era articulado desde o processo de impeachment.

R: Mas o poder que o Centrão tinha já estava colocado no governo Temer. Olha o ministério dele. Estou falando do acréscimo de poder. A iniciativa de Janot e Fachin fragilizou o PSDB. A razão da crise do PSDB é exatamente a votação em relação ao Temer. É fato que o PSDB dividiu.

ESP: De que forma o DEM se beneficia com a divisão do PSDB?

R: Hoje a previsão que se pode fazer é de que vai haver, no campo do centro, que é o que a gente busca há muito tempo, uma troca de personagens do PSDB com o DEM. O DEM pode ocupar esse espaço, seja com esse nome ou com outro nome. A razão foi a iniciativa do dr. Janot e do ministro Fachin. Ontem (10), o ministro Fachin disse que não vai incluir o nome do presidente Temer no caso do PMDB (o inquérito conhecido como “quadrilhão”). E, na minha leitura, a probabilidade do ministro Fachin colocar a segunda flecha é nenhuma. A segunda flecha é para 1.º de janeiro de 2019.

ESP: O que o sr. achou da denúncia?

R: Um ato com consequências jurídicas inócuas e consequências políticas e econômicas grandes. A primeira denúncia é de uma inutilidade gigantesca. Se se começa pela outra denúncia, de que houve ou não houve obstrução da Justiça, aí poderia ter um quadro diferente. Acho que foi uma precipitação que teve uma consequência política e econômica grande. Teve outra consequência que foi afetar a liderança política do presidente, que chegou a dizer que estamos vivendo um semiparlamentarismo. O que ele quer dizer com isso? Um homem com a experiência de Temer? “Eu estou enfraquecido.” O fortalecimento dele tem de ser o fortalecimento institucional, que é o caso da Câmara e Senado.

ESP: O que mudou entre o impeachment de Dilma Rousseff e a votação da denúncia contra Temer?

R: Primeiro, há uma adesão das elites empresariais às teses do governo Temer que é total, 100%. Tem um presidente da Câmara que tem a coragem de fazer uma defesa aberta e explícita às reformas liberais. O Brasil precisa que o governo Temer complete (o mandato) e a decisão de Fachin (de não incluir Temer no “quadrilhão”) vai ajudar muito o País.

ESP: O DEM terá candidato à Presidência em 2018?

R: Depende de ter nome, criar uma marca.

ESP: Rodrigo está descartado?

R: Não sei. O Brasil precisa que ele se reeleja deputado federal e que a Câmara continue com uma condução como a dele, não conflituosa.

ESP: O fato de ele descartar o Executivo tem alguma coisa a ver com o inquérito do qual ele é alvo?

R: Que é ridículo… Fachin agora mesmo cancelou o depoimento que ele iria dar.

ESP: Como acha que o DEM deveria aproveitar esse momento de crescimento?

R: Eu diria que dando tempo ao tempo. Se estivéssemos na Alemanha eu responderia que é automático o líder ascender a primeiro-ministro. Agora, no Brasil, com sistema orgânico, voto proporcional aberto e partidos sem marca… A iniciativa do Doria pode ser um bom exemplo para os quadros do DEM. Ele, que é um homem do marketing, de TV, foi dizer: ‘sou prefeito, mas quero ser candidato a presidente daqui a um ano’. Um ano! Aí ele faz uma programação para ter visibilidade. Os nomes que nós temos têm de se propor. O DEM não vai a reboque do PSDB.

14 de agosto de 2017

AS CONSEQUÊNCIAS POLÍTICAS E ECONÔMICAS DA DENÚNCIA JURÍDICA CONTRA TEMER!

1. Apesar de todos saberem que a Câmara de Deputados “apenas” autorizaria ou não o prosseguimento da ação contra o presidente Temer proposta pelo Dr. Janot e encaminhada pelo Ministro Fachin, a resultante do encaminhamento não foi politica e economicamente neutras. Aguardar até 1 de janeiro de 2019 retardaria a conclusão do processo, mas não produziria as consequências que produziu. Até porque o resultado do efetivo julgamento –fosse no STF, fosse nas instâncias inferiores- não estava de forma alguma definido.

2. Estudos econométricos comparando tendência do PIB com as taxas de incerteza e de confiança elaboradas pela FGV sobre o país e, em especial, sobre a economia, mostram uma forte correlação. O crescimento da taxa de incerteza ou a diminuição da taxa de confiança afetam diretamente o PIB. E ao afetar o PIB afetam a dinâmica dos investimentos, e o emprego, e reforçam uma maior incerteza e menor confiança no país.

3. É evidente que toda a cobertura que acompanhou o processo de Temer na Câmara de Deputados, com enorme destaque na mídia, criou uma sensação de descontinuidade do governo e imprevisibilidade. E –claro- de incerteza e desconfiança no futuro. Até o quórum para a votação era posto em dúvida e, portanto, o prazo de solução na Câmara de Deputados, agravando a imprevisibilidade.

4. As consequências políticas são visíveis. A começar pela votação da Reforma da Previdência, que já havia sido aprovada pela comissão especial, cuja aprovação eram favas contadas, já “precificada” a coreografia da oposição no plenário. Com a tramitação da denúncia contra Temer, esse processo foi não apenas interrompido mas colocado em dúvida.

5. O chamado centrão, da forma que é apresentado pela mídia e pela oposição, e que estava calmo dentro dos padrões de sempre, ressurgiu com enorme força, fazendo exigências para garantir o voto. E após a votação exigindo mais: o reforço de sua representação no governo e a perda de representação dos deputados da base do governo que votaram contra. Nada disso teria acontecido sem a tramitação do processo-Temer.

6. Da mesma forma, a fragilização do PSDB, que vinha enfrentando problemas internos com o “grampo” em seu presidente. Com a explosão da mídia em relação ao afastamento de Temer, os deputados mais sujeitos à opinião pública afetável passaram a projetar um desgaste político junto a suas “bases” com reflexo em 2018. E o mais atingido foi o PSDB, pela característica de suas lideranças políticas. A grave crise que se sucedeu no PSDB é amplamente explicada pelas decisões do partido, de suas lideranças e de seus deputados, em relação a tramitação da denúncia contra Temer.

7. Analistas afirmavam que uma decisão jurídica tem que ser técnica e não pode se pautar pelas consequências possíveis sobre a política e a economia. Mas não se tratava de julgar o presidente, e sim de definir a data do julgamento. O processo não seria interrompido, mas suspenso, com prazo certo. É assim que ocorre com os pedidos de “vista” num processo por parte de magistrados de segunda e terceira instâncias.

8. O brilhante e aplaudido discurso do Ministro Fux no julgamento de Temer-Dilma no TSE foi absolutamente claro ao dizer que a aplicação das normas e da técnica jurídicas não ocorre no vácuo. E que o ambiente, o clamor da opinião pública e seus desdobramentos previsíveis têm um peso importante e deve ser levado em conta. Mesmo que o caso/delação JBS tenha ocorrido após os fatos que estavam sendo julgados, aquele clamor e riscos teria que ser levado em conta.

9. Sendo assim, a simples postergação do momento do julgamento de Temer na denúncia do Dr. Janot não afetaria as normas e técnica jurídicas e evitaria as consequências políticas e econômicas –listadas acima- que ocorreram e afetaram a estabilidade em médio prazo. Consequências essas que têm uma permanência ainda indefinida.

11 de agosto de 2017

TEMER RECOMEÇA, PSDB PERDE, DEM GANHA, PT SOBREVIVE. E O POVO? –SUMIU!

(Eliane Cantanhêde – Estado de S. Paulo, 04) 1. Balanço da votação da denúncia contra o presidente Michel Temer pela Câmara: o governo ganha um recomeço, o PSDB foi o que mais perdeu, o PT demonstrou que tem sobrevida, o DEM foi o maior vencedor. E o “povo”? Não estava nem aí.

2. A sensação não só no Planalto como em toda Brasília é que Temer vai enfrentar solavancos, mas conseguirá atravessar a pinguela, avançar na pauta legislativa e concluir o mandato. A questão é saber como Temer fica, com quem e para quê. Boa parte das respostas está nas planilhas da votação pela qual a Câmara barrou a denúncia da PGR contra Temer por corrupção passiva. Há vitórias e vitórias. Foram 263 votos contra a denúncia, 227 a favor, 19 ausências e duas abstenções, resultado suficiente para manter o mandato, não para garantir as reformas. Não foi um banho.

3. O PT se dividiu quanto à estratégia de dar ou não quórum, mas aproveitou bem a exposição em horário nobre, votou em bloco com a oposição pela continuação do processo contra Temer no Supremo e condenou a reforma da Previdência. Um populismo irresponsável, mas que anima a militância e serve de isca para pescar votos, por exemplo, do funcionalismo em 2018.

4. Já os partidos governistas fizeram a farra e tiveram de tudo, enquanto o PSDB rachou exatamente ao meio: 22 pró-Temer e 21 contra, apesar da orientação do líder, Ricardo Tripoli, homem de Geraldo Alckmin no Congresso. O Planalto lembra que faltaram “só” 45 votos para os 308 necessários em mudanças constitucionais, como a reforma da Previdência, que volta com tudo à pauta nacional. E espera que muitos aliados que votaram contra Temer anteontem agora votem a favor das reformas, até mesmo da Previdência.

5. É o caso do PSDB, que vai ficar até o final do ano com Aécio Neves fingindo que é só um presidente licenciado e Tasso Jereissati encenando o presidente “interino”, mas ambos, como as bancadas na Câmara e no Senado, já anunciam apoio às reformas. Os tucanos racham diante de tudo, mas se unem a favor da modernização das regras trabalhistas (já aprovada) e previdenciárias (a ser votada).

6. O dilema do PSDB, porém, não é apenas diante de Temer, de denúncias, de cargos e de reformas. É uma crise de identidade, de lideranças e de indefinição quanto ao futuro. Fora do poder, eles já estão se matando; imagine se voltarem ao poder… Se o PSDB reboca o DEM (ex-PFL) desde a primeira eleição de Fernando Henrique Cardoso, em 1994, não está descartada a migração de parte dos tucanos para o novo partido que o DEM articula com os dissidentes do PSB.

7. À frente, o prefeito de Salvador, ACM Neto, para quem o céu é o limite, e o presidente da Câmara, Rodrigo Maia, um dos raríssimos políticos em ascensão nesse ambiente de terra arrasada. Maia cresceu na crise, conquistou o respeito de seus pares e da mídia, esfregou sua lealdade na cara de Temer e dos palacianos. E não se pode esquecer que ele é de um Estado em que, entre mortos e feridos, muito poucos se salvam. Depois de explodir Sérgio Cabral, os escândalos começaram ontem a se aproximar do ex-prefeito Eduardo Paes.

8. Para Temer, porém, a balança neste momento é entre o PSDB, o aliado chique e temperamental, e o Centrão, nada chique e muito pragmático. Quanto mais o PSDB escapulir, mais o Centrão vai entrar no governo. Mas o que realmente interessa é que todos eles, juntos, vão embalar a reforma da Previdência.

9. Rodrigo Janot foi derrotado? Nem tanto. Os que votaram contra a denúncia justificaram com a economia, raramente contra o conteúdo. E a autorização da Câmara é justamente para isso: contrabalançar a motivação jurídica com a conveniência política (até do País).

10 de agosto de 2017

COMO ENFRENTAR A CORRUPÇÃO!

Entrevista do professor Michael Muthukrishna, da London School of Economics, onde vem estudando as conexões entre corrupção, economia e psicologia, à Folha de S. Paulo (09).

1. Folha: Em seu mais recente trabalho, o sr. fala que a transparência pode não contribuir para reduzir a corrupção. Como isso é possível?

Michael Muthukrishna: Na maioria dos experimentos que conduzimos, a transparência reduziu, sim, a corrupção. Mas, quando o potencial econômico [a capacidade de ganhar dinheiro por meios lícitos] de um grupo é pequeno e as instituições são muito frágeis para punir os transgressores, a transparência não ajuda, ou torna as coisas ainda piores. Nesse caso específico, o que acontece? A transparência revela que a corrupção e a propina são generalizadas e que não existem muitos meios legítimos de ganhar dinheiro. Isso as leva ao cinismo, a desistir, a dar continuidade ao status quo. “Se não pode com eles, junte-se a eles.” Para que a transparência reduza a corrupção, é preciso que haja uma regra anticorrupção. Ou seja, que a população desaprove a corrupção como um todo e tenha consciência que os outros também a desaprovam. Num cenário ideal, não apenas a corrupção dos outros, mas também as pequenas formas de corrupção no dia a dia. Mas isso não vai acontecer se não houver formas legítimas de se ganhar dinheiro, ou se o Estado não tiver as ferramentas para impedir as pessoas de serem corruptas.

2. F: Isso quer dizer que, em países pobres, a probabilidade de corrupção é maior?

MM: A corrupção tende a ser maior em países pobres, mas nem sempre está claro se a pobreza cria as condições para a corrupção, ou se a corrupção é que torna esse país mais pobre. É um pouco das duas coisas. Num país pobre, você não tem outra escolha que não seja se fiar em pessoas como seus amigos ou família, porque não se pode confiar no Estado para cuidar de seus interesses. Isso cria uma cultura em que você tem compromissos com relação a eles; e eles, com relação a você. Se você mora num país como a Austrália, por exemplo, o governo irá ajudar a cuidar de você, pagar sua universidade. Você não precisa depender tanto de família ou amigos.

3. F: O Brasil se encaixa nesse cenário de pobreza?

MM: Não. A recente performance econômica do Brasil e os indicadores de que o país pode estar saindo da recessão sugerem que o potencial econômico é bastante alto.

F: Em seu trabalho, o sr. também relaciona a corrupção a uma escala de cooperação. Pode explicar?

MM: O que chamamos de corrupção está próximo da nossa natureza. Por exemplo, sempre vivemos em famílias ou pequenos grupos e sempre as priorizamos em detrimento de outras pessoas. Privilegiar nossos amigos e familiares é próximo da nossa natureza. Normalmente, as pessoas entendem isso como algo muito bom. Mas, quando um político ou um empresário prioriza seus amigos ou familiares, eles estão fazendo isso às custas de muitos outros. As pessoas podem achar que agiriam de forma diferente se estivessem no poder. Mas, na verdade, se elas pensarem sobre seus comportamentos diários, perceberiam que agem de forma bastante similar a muitos políticos e empresários. Elas só não têm o poder de fazê-lo em uma grande escala, de maneira que prejudiquem milhares de pessoas ou um país inteiro. Elas não estão ganhando bilhões; elas estão apenas fazendo pequenos favores a seus amigos e familiares.

4. F: Então, a questão não é sobre maçãs podres?

MM: Exatamente. E isso é o que faz a investigação e o julgamento desses casos ser tão desafiador. A questão não é identificar e processar todos os agentes públicos corruptos, esperando que eles sejam substituídos por pessoas honestas. Você pode acabar prendendo o país inteiro, porque essas pessoas não corruptas podem não existir. A questão é punir pessoas em número suficiente para que outros comecem a mudar o seu comportamento.

5. F: Uma pesquisa Datafolha mostra que, desde 2015, a corrupção se tornou o pior problema do Brasil. É sinal de que as coisas estão mudando?

MM: É um bom sinal que os brasileiros estejam identificando a corrupção como um problema, porque isso pode significar que existe uma regra anticorrupção no país. Mas é preciso garantir que essa indignação seja contra o fato de a corrupção existir, e não porque as pessoas não estejam se beneficiando disso.

6. F: A Lava Jato pode ajudar a criar uma mudança cultural?

MM: Ah, sim. Existem coisas muito boas. O fato de as pessoas verem que isso está acontecendo é exatamente o tipo de mudança que é necessário. Não é mais “business as usual” [negócios como antes]. Quando isso acontece, elas vão refletir: e agora? O que é a regra? A expectativa é que você acabe num cenário em que a corrupção, a propina e a lavagem de dinheiro não sejam mais aceitáveis.

09 de agosto de 2017

EXECUÇÃO ORÇAMENTÁRIA DA PREFEITURA DO RIO NO PRIMEIRO SEMESTRE DE 2017!

Dados publicados no Diário Oficial da Prefeitura do Rio no dia 28 de julho de 2017 – Comparação entre valores de 2017 e de 2016, estes corrigidos pelo IPCA de 4%.

A. RECEITAS:

1. Tributárias próprias: 2017: R$ 5,337 bilhões. Queda real de (-4,6%).
1.1. IPTU. 2017: R$ 1,736 bilhão. Crescimento real de +4,7%.
1.2. ISS. 2017: R$ 2,485 bilhões. Queda real de (-14,1%).
1.3. ITBI. 2017: R$ 265,4 milhões. Queda real de (-4,7%).
1.4. IRRF. 2017: R$ 515,3 milhões. Crescimento real de +14,8%. (O imposto de renda na fonte dos servidores é receita da prefeitura.)

2. Transferidas:
2.1. FPM. 2017: R$ 112,9 milhões. Crescimento real de +5,5%.
2.2. ICMS. 2017: R$ 898,8 milhões. Queda real de (-7,2%).
2.3. IPVA. 2017: R$ 550,3 milhões. Queda real de (-2,4%).
2.4. Dívida Ativa. 2017: R$ 106,5 milhões. Queda real de (-20,4%).
2.5. Operações de Crédito. 2017: R$ 18,7 milhões. Queda real de (-98%).

3. DÍVIDA PÚBLICA CONSOLIDADA:
31/12/2016. R$ 14,26 bilhões. 30/06: R$ 14,25 bilhões.

4. RECURSOS EM CAIXA: R$ 2,889 bilhões. Crescimento real de +23%.

B. DESPESAS:

1. Pessoal e Encargos. 2017: R$ 7,142 bilhões. Crescimento real de +4,7%.
2. Aposentados. 2017: R$ 1,745 bilhão . Crescimento real de +9,9%.
3. Pensionistas. 2017: R$ 304,8 milhões. Crescimento real de +6,6%.
4. Juros da dívida. 2017: R$ 327,1 milhões. Crescimento real +11%
5. Amortização da dívida. 2017: R$ 151,5 milhões. Crescimento real de +15,9%.
4+5. Serviço da Dívida. 2017: R$ 478,6 milhões. Crescimento real de +12,5%.
6. Investimentos. 2017: 125,2 milhões. Queda real de (-94%).

C. RESULTADO PRIMÁRIO 2017:

Saldo +926,2 milhões contra um déficit primário no final do semestre em 2016 de menos (R$ -501 milhões) em 2016 no final do semestre.

D. RECEITAS PREVIDENCIÁRIAS:

1. Contribuição dos segurados. 2017: R$ 261 milhões. Crescimento real de +8,3%
2. Contribuição Patronal. 2017/ R$ 1,304 bilhão. Crescimento real de +6,7%.
3. Resultado Previdenciário. 2017: ( Menos -R$ 68,3 milhões). Queda real de (-13,3%).

E. COMENTÁRIOS:

1. As receitas que dependem da atividade econômica, ISS e ICMS, tiveram uma queda real somada de R$ 480 milhões.
2. O IPTU teve crescimento real de R$ 80 milhões.
3. As operações de crédito estão praticamente paradas, assim como os investimentos.
4. As despesas de pessoal ativo e inativo tiveram crescimento real em torno de 6%.
5. O serviço da dívida teve crescimento real de R$ 54 milhões.

F. As boas notícias vieram a) do saldo de recursos em caixa em 30 de junho de R$ 2,9 bilhões. Mesmo excluindo as provisões para despesas de pessoal, teríamos R$ 1,4 bilhão em caixa no final do primeiro semestre. b) A melhoria do resultado primário do orçamento, que de deficitário passou a ser superavitário em R$ 926 milhões. c) E o resultado previdenciário que observou uma redução real do déficit em -13,3%.

08 de agosto de 2017

POR QUE AS RUAS FICARAM SILENCIOSAS?

1. As semanas que envolveram as delações da JBS até o arquivamento pela Câmara de Deputados da denúncia contra o Presidente Temer mostraram uma quase completa ausência de protestos nas ruas, apesar da intensa cobertura dos meios de comunicação com os vídeos gravados com o delator, mala de dinheiro circulando, declarações dos chamados formadores de opinião e do multiplicador das redes sociais.

2. Por quê? Se a mídia tentava explicar a votação na Câmara de Deputados em função das abordagens pelo Executivo aos deputados, isto nada tem a ver com as ruas vazias e silenciosas durante este processo.

3. As mobilizações populares têm características que se repetem. A dialética das mobilizações observa um polo sobre o qual são direcionados os protestos. E outro polo são as alternativas. Se há que eliminar um polo, simultaneamente, a mobilização deve se dirigir a impulsionar o outro. O polo alternativo é automático. Essa é sempre a marca das revoluções.

4. O Fora Collor tinha os dois polos. O Fora Dilma tinha os 2 polos. O Fora Temer tinha apenas um polo, até porque a alternativa de Diretas Já, proposta, por ser inexequível, era apenas um slogan de auto-agitação.

5. A crise econômica em curva de aprofundamento acompanhou o Fora Collor e O Fora Dilma. Mas a crise econômica com Temer, em processo de superação, e não de aprofundamento, não excitava a mobilização.

6. A intensa cobertura dos meios de comunicação -em especial da TV- só apontava para um polo. Até porque defendia as ações que o outro polo implementava.

7. As pequenas mobilizações pontuais que ocorreram eram lideradas pelo polo que havia sido desintegrado no impeachment de Dilma. Com isso, em vez de ser um polo de atração, era um polo de exclusão.

8. Por isso tudo, é natural que o impacto da cobertura dos meios de comunicação do caso Temer fosse mitigado pela ausência de alternativa e pelos efeito de exclusão -de força centrífuga- daqueles que agitavam suas bandeiras e palavras de ordem em algumas esquinas.

07 de agosto de 2017

ALGUMAS QUESTÕES QUE AJUDAM A ENTENDER O VOTO DOS DEPUTADOS NO CASO TEMER!

1. As análises simples que procuram explicar as razões do voto parlamentar em situações complexas, como esta no caso da denúncia da PGR em relação ao Presidente Temer, aliviam a consciência dos analistas –politólogos ou jornalistas ou…-, mas às vezes estão equivocadas.

2. Tratar o envolvimento de deputados pelo executivo com promessas, cargos e antecipação de emendas ao orçamento como decisivas para explicar aqueles votos é, pelo menos, ingenuidade. Esses recursos também foram usados nos casos Collor e Dilma e não resultaram. E são usados todos os dias; e o mensalão é apenas um caso emblemático. No caso Dilma, num processo que durou 9 meses, ainda mais.

3. Há deduções diretas que ajudam a entender, a clara expectativa de vitória de Temer. O ponto seria a diferença que, conforme os números, poderia ser uma vitória de Pirro ou não. Por exemplo, se os votos contra Temer superassem os 60% e os a favor ficassem próximos da fronteira dos 33%. Mas não foi assim: a favor de Temer cerca de 55% e contra 45%.

4. Como parte dos 45% trataram dos desdobramentos políticos dos votos como desgaste um ano antes do início da campanha eleitoral de 2018 mas não romperam com as prioridades do governo, pode-se afirmar que, para efeito do voto nas leis complementares ou emendas constitucionais que virão pela frente, a vantagem do governo ficou pelo menos na fronteira da maioria constitucional.

5. O que surpreendeu a muitos analistas foi que com todo o ambiente favorável ao afastamento de Temer por parte dos meios de comunicação –TV, Rádio, Jornais e Revistas–, por parte dos artistas e intelectuais, por parte da opinião política mais a esquerda, e corporativa, e uso das redes sociais hipoteticamente impactados pelas votações da reforma trabalhista e futura da reforma previdenciária, em nenhum desses casos a maioria foi sensibilizada.

6. Nos casos de Collor e Dilma, ao contrário, o clima de opinião pública foi estimulado e claramente envolvido pelos mesmos atores (mídia, etc.). Nos dois casos a crise econômica foi um impulsionador. Mas a questão ética que envolveu Collor não envolveu Dilma diretamente.

7. No caso Temer, a questão ética foi colocada no eixo central e a crise econômica, apesar das projeções dos economistas, não ajudou Temer, fora de uma opinião localizada que não se pode confundir com opinião pública. Então o que explica a votação pró-Temer?

8. Com um pouco de reflexão se conclui que dois vetores são explicativos. O primeiro é a autonomia muito maior, hoje, da opinião dos deputados em relação aos meios de comunicação. Se a prioridade maior deles é sua reeleição em 2018, toda a enorme mobilização dos meios de comunicação não ampliou a percepção de risco dos deputados em relação a seus mandatos. E esse risco foi exaltado pelo noticiário e pesquisas. Mas não pegou.

9. Em alguma proporção porque a opinião pública difusa, hoje, está muito mais pulverizada que antes. As redes sociais ajudam a explicar esta pulverização. A proporção do entretenimento na mídia e nas redes, idem. Por outro lado, a questão da corrupção em relação aos políticos formou uma opinião generalizada, desgastando fortemente a imagem de todos. Assim, nas ruas e nos aeroportos não havia diferença entre eles. E os deputados perceberam isso. Uma espécie de tanto faz. Afinal, numa eleição, a disputa é entre eles.

10. O segundo vetor relacionado com o silêncio das ruas é que o desgaste de quem governa não veio, como das outras vezes, acompanhado de alternativas visíveis e colocadas, pelas quais valeria a pena lutar e se mobilizar. Esse vetor será um outro capítulo a ser tratado outro dia.

04 de agosto de 2017

GANGUES: DA AMÉRICA CENTRAL À AMÉRICA DO NORTE!

1. Chama-se MS-13, o que significa Mara Salvatrucha 13. “Mara” é um termo de calão em espanhol da América Latina para gangue. “Salva” é a abreviatura de salvadorenho e “Trucha”, um sinônimo de malandro. O número 13 tem a ver com a duração em segundos da tarefa coletiva que os recrutas da quadrilha levam no ato de iniciação.

2. Os seus membros apresentam-se totalmente tatuados, em especial no rosto. É indiscutivelmente uma das gangues mais sanguinárias do continente americano, com ramificações desde o Canadá até São Salvador e Honduras, dedicando-se à extorsão, ao tráfico de droga e de pessoas. O seu lema em espanhol é “mata, viola, roba, controla”. Dispensa tradução e diz tudo sobre a forma de atuar do grupo.

3. Chegaram aos Estados Unidos na década de 80, juntamente com refugiados salvadorenhos fugidos à guerra civil entre as forças governamentais e a guerrilha da Frente de Libertação Nacional Farabundo Marti, conflito esse onde a América de Reagan interveio em força, apoiando o lado governamental.

4. O foco inicial da atividade foi Los Angeles, onde a formação do grupo seguiu o modelo habitual, começando como uma milícia para defender as gentes do bairro contra os “de fora” (outras gangues, polícia, etc.) e evoluindo para o tráfico de droga, a extorsão, etc. “Foi desde o início uma gangue extremamente violenta”, explica Jorga Leap, especialista em grupos violentos da Universidade de Los Angeles (UCLA).

5. Atualmente, calcula-se que tenha ao todo 30 mil membros nas Américas do Norte e Central. Está presente em 40 estados dos EUA, tendo sido considerado desde 2012 pelas autoridades norte-americanas como “organização criminosa internacional”.

6. Nos últimos 18 meses terão assassinado 17 pessoas em Long Island, nos subúrbios de Nova Iorque. Foi o caso de dois adolescentes massacrados à cacetada em setembro do ano passado e de quatro homens retalhados à espadada e descobertos num parque em abril. O que levou William Sweeeney, chefe do FBI em Nova Iorque, a dizer à CNN que “se trata de gente para quem a vida humana não significa nada”.

7. O presidente dos EUA parece agora ter resolvido dar importância ao MS-13 declarando sexta-feira, durante uma visita à polícia de Long Island, que “são animais e vamos destruir este cartel infame” não especificando quando nem como. Onde Donald Trump se mostrou mais concreto foi na interpretação política dos fatos. Disse que o MS-13 era a consequência das políticas frouxas de imigração de Barack Obama. Ora as estatísticas da polícia não sugerem um aumento significativo do efetivo da gangue durante os oito anos de permanência de Obama na Casa Branca, estabilizado em dez mil. E a história do MS-13 começa, como se referiu, no tempo de Reagan e da guerra civil salvadorenha.

8. Acresce que, ao longo de décadas, uma das coisas que espalhou o MS-13 como uma praga foi a política de deportações para o país de origem de gente condenada nos EUA por pertencer ao grupo.

9. O terreno preferido de recrutamento do MS-13 são jovens migrantes recém-chegados aos EUA, que não falam inglês e ficam contentes com a “proteção” que a gangue lhes oferece (a troco da participação em atividades criminosas, como é óbvio). Ora a pressão acrescida sobre a imigração ilegal da administração Trump faz com que este tipo de pessoas – das poucas que poderiam testemunhar e ajudar a polícia a desmantelar o MS-13 – tenha medo de o fazer com receio de ser deportado.