13 de outubro de 2021

FELIPE GONZALEZ, EX-PRIMEIRO-MINISTRO ESPANHOL – EM SEMINÁRIO EM SP EM 2004!

(Resumo de Cesar Maia) O espaço público que compartilhamos é a política, mas a que se faz com P maiúsculo, ou seja, a arte de governar as diferentes ideias, as diversas identidades e os interesses opostos. E governar não só para que as diferenças convivam entre si pacificamente, mas sim para, dessa pluralidade de ideias, dessas diferentes identidades e dessa contraposição de interesses, tirar um projeto para o país.

Não creio em nenhum modelo econômico que diz que antes é preciso crescer para depois atender ao problema ético ou moral da equidade social. E não é apenas um problema de igualdade, mas de eficiência econômica. É impossível ter empresas fortes num país em que há miséria, que tem uma sociedade marginalizada. Não pode haver ao mesmo tempo pobreza e grandes empresas.

Há sempre um ponto de inflexão que permite diferenciar o que significa país emergente e país central. As vezes fala em país desenvolvido e subdesenvolvido, mas essa é uma linguagem ofensiva. Há 25 anos éramos um país qualificado como receptor de ajuda para o desenvolvimento. Agora é um país obrigado a prestar ajuda ao desenvolvimento de outros países. Portanto passamos a ser um país central. Nem um só país conseguiu passar de emergente para central sem uma área de consenso muito séria.

No autoritarismo se nacionalizava como instrumento de poder. A esquerda proclama a nacionalização como instrumento ideológico de igualdade de oportunidade, o que nunca foi. Isso nunca se demonstrou em nenhuma parte. Havia um matrimonio raro com essa ideia, que me leva a dizer com frequência que nos casamos com os instrumentos e esquecemos que as vezes os instrumentos nos alijam dos objetivos. Há de ser flexível com os instrumentos e tenazmente comprometido com os objetivos.

Eu disse que não acreditava que a Europa seja um motor alternativo do crescimento mundial. Hoje a Europa tem uma moeda única para um conjunto de países. Mas não tem uma política econômica suficientemente coordenada que acompanhe a política monetária. Portanto, não tem flexibilidade suficiente para fazer política econômica pragmática. Não tem margem de flexibilidade.

Gastos na Educação, é a única estratégia que nunca falha para o desenvolvimento de um país. A única que nunca falha. Essa é uma variável estratégica fantástica, um recurso natural como o petróleo, com a vantagem que a melhor variável estratégica é o capital humano.

O que faltava em nosso país, era um pouco mais de confiança em nós mesmos, que não tínhamos, e um pouco mais, ou muito mais na formação dos jovens de meu país. Portanto a Educação é a grande variável estratégica. Mas um projeto educativo tem que ser para 20 anos. Não pode ser um projeto que mude quando o governo é trocado. Portanto é preciso que haja um consenso básico do que se deve fazer com a educação.

Nosso país teve de suportar um processo de olhar para si mesmo, de autoconhecimento, de parar de pensar que seus inimigos estavam fora. Que ora era o Reino Unido, ora a França, ora os Estados Unidos.

Em política exterior o consenso é fundamental. Os países centrais, os países respeitados, são países que não variam substancialmente sua orientação de política exterior. Porque as variações dramáticas em política exterior têm um impacto diferente do que as mudanças na política interna, porque afetam os outros.

Mas nunca se pode confundir descentralização do poder com centrifugação do poder. Para poder descentralizar é preciso manter a coesão interna. Tivemos problemas de confusão entre descentralização e centrifugação do poder. A má divisão do poder, rompendo a coesão, debilita as partes e debilita o todo. E isso não aconteceu apenas aqui.  

O Estado também tem de redimensionar suas funções. Nunca defendi um Estado cheio de gordura. Nunca defendi o clientelismo que absorve porcentagens inaceitáveis do PIB. Mas nunca me inclinei por um Estado raquítico, anêmico, sem capacidade de resposta ante sua responsabilidade. O ideal seria ter um Estado como esses corpos fortes como os vistos em Ipanema, que não tem nem uma grama de gordura, mas também nunca se veem esqueléticos, porque esses não passeiam pelas praias. Esse é o Estado ideal.