01 de junho de 2018

CRISE INSTITUCIONAL NA ESPANHA!

(RFLR) 1. Rajoy é destituído; Pedro Sánchez é o novo chefe do governo da Espanha. Abalado por casos de corrupção em seu partido, Mariano Rajoy reconheceu mesmo antes da votação que seria derrotado. Seu breve discurso de despedida no parlamento da Espanha é um exemplo para os democratas do mundo todo.

2. Na sequência da condenação de dirigentes e do próprio Partido Popular no caso Gürtel, o PSOE de Pedro Sánchez apresentou com uma moção de censura. Para ter sucesso, o dirigente socialista terá de mostrar dotes de negociador e alcançar o apoio dos partidos nacionalistas catalães e bascos ou do Ciudadanos

3. Não é provável, mas pode dar-se o caso de a moção de censura não cumprir algum requisito e ser invalidada pela mesa do Congresso. A Constituição espanhola e o regulamento parlamentar exigem que a iniciativa seja subscrita por 35 deputados, pelo menos, e que inclua um candidato para substituir a chefia do governo.

4. A moção do PSOE tem o apoio integral da sua bancada, ou seja, de 84 representantes socialistas. E indica um não deputado – o secretário-geral do partido, Pedro Sánchez – candidato ao cargo, o que também é válido. Outra hipótese de a moção não ser votada é dar-se ainda o caso de PSOE e PP se concertarem: o primeiro retiraria a moção e Mariano Rajoy convocaria eleições antecipadas.

5. Se a moção estiver conforme os regulamentos, cabe à presidente do Congresso, Ana Pastor (do PP), agendar a moção, tendo em conta os compromissos do primeiro-ministro. Da apresentação à votação há um período mínimo de cinco dias, sendo que nas primeiras 48 horas podem ser apresentadas moções alternativas. Estas seriam discutidas e votadas no mesmo plenário. Contas feitas, a votação só ocorre em junho.

6. A aritmética indica-nos que uma moção de censura só vinga quando votada favoravelmente por 176 deputados, pelo menos. Além dos 84 votos dos socialistas, já se sabe que conta com o Unidos Podemos (67 deputados). Pablo Iglesias, em meio de uma crise interna que lhe pode custar a liderança – um plebiscito online por parte dos militantes que termina hoje – afirmou que apoia de forma incondicional a moção de censura para “desalojar os corruptos”, mas lembrou que é necessário instaurar um programa social. Além do Podemos, há ainda os votos garantidos de Compromìs (quatro), e Nova Canárias (um) o que é insuficiente para o sucesso da iniciativa, uma vez que fica a 20 votos da aprovação. Com mais ou menos apoios, se a moção não passar, o plano de Mariano Rajoy passa por convocar eleições antecipadas para março de 2019, ou, caso a situação política se deteriore, para este outono, revela o La Vanguardia. Publicamente, no entanto, o chefe do governo reafirmou que é seu objetivo cumprir a legislatura, iniciada em novembro de 2016.

7. Nas próximas horas Pedro Sánchez e a sua equipe têm a missão de convencer os restantes partidos. Mas obter o apoio simultâneo de nacionalistas (PNV, Bildu, PDeCat, ERC) e do Ciudadanos é visto como realizar a quadratura do círculo. Para catalães e bascos se aliarem aos socialistas, estes terão de afinar a mensagem. Sánchez relembrou que um governo seu “fará cumprir a Constituição”, uma outra maneira de dizer que apoia a manutenção em vigor do artigo 155.º na Catalunha. Mas poderá introduzir no discurso algumas nuances para chegar a um acordo com os nacionalistas.

8. A chave, creem os analistas espanhóis, reside no Partido Nacionalista Basco (PNV), que tem sido parceiro do Partido Popular. Ainda na quarta-feira a formação centenária foi determinante para a aprovação do Orçamento Geral do Estado espanhol. No entanto, o partido liderado por Andoni Ortuzar já mostrou abertura para negociar com o PSOE. A “crise territorial do Estado” é uma das prioridades do PNV, que exige o reconhecimento do autogoverno no País Basco e na Catalunha.

9. A primeira reação do Ciudadanos foi de que descartava a moção porque não queria substituir Rajoy por Sánchez, mas sim novas eleições. E que não alinharia num acordo em que estivessem incluídos os partidos independentistas catalães. À formação de Albert Rivera, os socialistas responderam ontem ao prometerem a realização de eleições num espaço de “alguns meses”, uma vez posta em funcionamento uma “agenda social”, que passe pela subida de salários, pensões e de mais verbas para a educação.

10. O Ciudadanos propôs então que o PSOE retirasse a moção e se apresentasse outra, uma “moção instrumental”, sem Sánchez nem Rivera como candidatos. Mas essa figura não existe em Espanha. Mesmo que o PSOE decidisse ir de imediato para eleições antecipadas, estas só podem realizar-se 54 dias depois da convocação.

11. Desde 1978, ano em que a Constituição da Espanha democrática entrou em vigor, foram apresentadas três moções de censura. A primeira, em 1980, ficou marcada por um debate que se prolongou por 20 horas. Foi apresentada pelo grupo parlamentar socialista contra o governo liderado por Adolfo Suárez, da União do Centro Democrático, mas os 152 votos favoráveis foram insuficientes para levar Felipe González para o poder. O socialista foi desafiado em 1987 pela Aliança Popular (antecessor do PP), mas apenas 67 deputados deram o sim à moção. Por fim, no ano passado, o Unidos Podemos apresentou Pablo Iglesias como alternativa a Mariano Rajoy e reuniu 82 votos favoráveis. Então, o PSOE acusou Iglesias de atuar de “má-fé” e de ser “irresponsável”.