08 de julho de 2020

ACERTO DE CONTAS!

(Folha de S. Paulo, 06) No quadro de desvalorização da moeda nacional e recessão aguda causada pelo novo coronavírus, a contrapartida é uma transformação radical nas transações do país com o restante do mundo.

As exportações caíram 6,4% no primeiro semestre, ante o mesmo período de 2019, refletindo a redução de atividade nos principais mercados. Estados Unidos, Europa e América Latina, cruciais para o Brasil, compraram muito menos, e as vendas da indústria caíram 15,1% no período.

Mais positivo é o desempenho dos produtos primários, cujas vendas chegaram a US$ 26,2 bilhões de janeiro a junho, alta de 23,8%, graças à demanda da China por itens como minério de ferro e soja.

O gigante asiático ocupa há anos o posto de principal comprador dos produtos brasileiros, e essa importância crescerá agora. A participação chinesa nas exportações deverá aumentar de 28,5% em 2019 para até 35% neste ano.

Ficam ainda mais temerários, nesse cenário, as recorrentes hostilidades ao parceiro vindos da diplomacia do governo Jair Bolsonaro.

A recessão e o real desvalorizado, por sua vez, levaram a uma retração das importações de 5,2% no primeiro semestre, mas a queda deve se acentuar com a menor demanda interna. Com isso, nas estimativas oficiais, a balança comercial encerrará o ano com saldo de US$ 55,4 bilhões, 15,2% acima do obtido em 2019.

Também há mudanças nas transações de serviços com o resto do mundo, tipicamente deficitárias, em razão de menores remessas de lucros e despesas de viagens internacionais. No agregado, as transações com o restante do mundo podem ficar perto do equilíbrio.

Trata-se de alteração substancial ante as projeções que apontavam para déficit anual na casa de US$ 60 bilhões antes da pandemia.

Compensa-se, assim, a continuada saída de investimentos estrangeiros de curto prazo. Com a taxa básica de juros em 2,25%, o Brasil se tornou —ainda bem— menos atrativo para dinheiro especulativo.

Mas com elevadas reservas em moeda forte, de US$ 348 bilhões no final de junho mesmo depois das intervenções no Banco Central nos últimos meses, não há crise de financiamento externo.

Juros baixos no mundo e o ajuste das contas externas sugerem que o país tem algum tempo para retomar reformas e favorecer o crescimento. Mas a situação é frágil e os riscos são maiores agora.