05 de setembro de 2022

O DESPERTAR TARDIO DE UM FALCÃO!

(Paulo Leme, professor de finanças na Universidade de Miami e presidente executivo do Comitê Global de Alocação da XP Private – O Estado de S. Paulo, 04) Na última semana de agosto, o banco central americano (Fed) organizou em Jackson Hole o seu prestigioso simpósio anual sobre política monetária. O grande destaque deste ano foi o discurso do Presidente do Fed, Jerome Powell. Ele mandou um recado curto e grosso para o mercado: o Fed vai continuar subindo a taxa de juros bem acima das expectativas do mercado.

Para reduzir a inflação, o Fed terá de usar duramente as suas ferramentas (alta de juros e contração do seu balanço) para contrair a demanda agregada e esfriar o mercado de trabalho. Ele alertou que este processo será penoso para famílias e empresas. Powell disse que outra alta de 0,75% talvez seja necessária, mas que 0,50% seria suficiente caso os dados de inflação e de atividade estejam em queda.

Na palestra, Powell jogou outro balde de água fria nos pombos do mercado ao afirmar que, apesar de bem-vinda, a queda da inflação observada em julho é devida à queda do preço do petróleo.

Powell afirmou que o Fed só cortará a taxa juros quando a inflação cair de volta à meta de 2%, o que só ocorrerá em princípios de 2024. Portanto, acabou com sonho dos neófitos em matéria de inflação, que ingenuamente sonhavam que o Fed daria um pivô para iniciar o ciclo de corte de juros no segundo trimestre de 2023.

O mais provável é que, em setembro, o Fed aumentará novamente os Fed Funds em 0,75% (para 3%), reduzindo o ritmo de alta de para 0,5% só em novembro e 0,25% em dezembro. Desta forma, os Fed Funds terminarão o ano em 3,75%. Em 2023, o Fed dará mais duas altas de 0,25%, mantendo a taxa de juros em 4,25% até o final de 2023. Os primeiros cortes só virão em 2024. Além do aumento dos juros, o Fed apertará mais ainda a política monetária ao encolher o seu balanço.

A boa notícia é que o despertar do falcão em Jackson Hole aumentou as chances de o Fed reduzir a inflação. A má notícia é que isto virá ao custo de uma recessão e aumento do desemprego. O aperto da política monetária aumentará as taxas longas de juros, mantendo os mercados de renda fixa e variável em um bear market. Além disso, o dólar continuará a se valorizar em relação às outras moedas e o fluxo de capitais para as economias emergentes diminuirá, desvalorizando o real e reduzindo o crescimento da economia brasileira.

O viés de risco da inflação americana é de alta, porque gastos públicos e privados com defesa e meio ambiente manterão parte da demanda agregada aquecida. Assim sendo, é provável que os EUA terminarão com uma taxa de juros bem acima de 4,25% e uma recessão longa e profunda