É a economia, estúpido?

Publicado em 30.05.2009 em Folha de São Paulo

A PESQUISA GPP de 16 e 17 de maio no Estado do Rio mostrou níveis de aprovação de Lula que nunca antes no Rio se havia visto.

Quando pesquisas nacionais apontavam níveis superiores a 70% (2008), a avaliação “ótimo-bom” de Lula na capital do Estado não chegava a 50%. Nessa última pesquisa, obteve no Estado 65% -na capital, 59%; na Baixada (popular), 74%; no interior industrial, 72%; no interior, 65%. As avaliações do governador permanecem entre 30% e 35%, apesar de feéricas campanhas publicitárias na TV, colagem em Lula e a boa vontade da imprensa local.

Lá se vão oito meses da crise econômica, com dados graves de desemprego, quebra de empresas e um futuro de incertezas. O Brasil, neste período, ficou entre os países com dados mais acentuados de queda na indústria, no PIB e no comércio exterior. Por que razão a máxima “é a economia, estúpido”, de Carville (assessor de Clinton na época), que relaciona a economia à política não atingiu Lula? O indicador mais óbvio seria o desemprego, que afeta alguns diretamente e indiretamente os que temem o desemprego.

A Pesquisa Mensal de Emprego do IBGE pode ajudar. Sendo pesquisa, tem alguma margem de erro. Mas a série de muitos anos sempre foi incorporada como sinal dos fatos nas principais regiões metropolitanas e em seu conjunto. Compare-se a PME de abril, de 2008 e de 2009. Pessoas em idade ativa aumentaram 496 mil, ou 1,2%. Pessoas economicamente ativas (PEA), 148 mil, ou 0,6%.

E não economicamente ativas (Pnae) 348 mil, ou 2%. Em seguida, abram-se os elementos negativos da Pnea. As pessoas que gostariam e estavam dispostas a trabalhar diminuíram de 12,2% para 12%. As marginalmente ligadas às PEA cresceram de 4,6% a 5,2%.

As desalentadas diminuíram de 0,1% a 0%. A taxa de desocupação cresceu de 8,5% para 8,9%, mas, paradoxalmente, o percentual de pessoas subocupadas por insuficiência de horas trabalhadas caiu de 3,4% a 3%. Vale dizer: a taxa efetiva de desocupação, somando o desemprego aberto com o emprego precário, ficou estável em 11,9%.

Questionar os números vis a vis da crise é infantil depois de tantos anos. Os trabalhadores metropolitanos irem para o interior? A lógica é o inverso. É provável que o Bolsa Família tenha reduzido a migração, e isso ajudaria a explicar os números. Passando à lógica política, talvez os discursos de Lula o situem como um protetor.

Isso explicaria até números piores e sua avaliação. O mais provável é que os números estejam certos e que os primeiros meses de desemprego estejam protegidos pela indenização, FGTS, seguro-desemprego e a esperança. Mas não explicam a avaliação crescente de Lula no Rio.

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CESAR MAIA escreve aos sábados nesta coluna.

A Cidade da Música!

1. A Cidade da Musica -antes batizada por seu idealizador o consagrado arquiteto especialista em complexos com salas de concerto como centro de gravidade, Christian Portzamparc, como Cidade das Artes, é um grande complexo de atividades tendo a musica como tema. Na eleição de 2000 o prefeito Cesar Maia incluiu em seu programa a prioridade de realizar um grande investimento para que o Rio recuperasse a centralidade num dos vetores das artes. Lembrava que não há centralidade cultural,nem esportiva, em nenhum cidade do mundo, sem grandes e sofisticados equipamentos que sirvam de base e referencia.

  2. A decisão foi ter as Artes Plásticas como esse tema. Estabelecida a parceria com a Fundação Guggenheim, dentro de sua rede de museus, e desenhado o projeto-base pelo arquiteto Jean Nouvel, iniciou-se uma reserva de recursos para 5 anos, de 250 milhões de dólares. O projeto foi obstruído na justiça por ação da oposição. Insistir nesta linha mudando de parceria, insinuaria uma provocação ao poder judiciário, na medida que a questão colocada no TJ foi um equipamento centralizador em artes plásticas contemporâneas, independente da parceria.  

 

3. Desta forma -mantida toda a concepção das razões de um grande equipamento de qualidade internacional- a decisão foi substituir o tema -Artes Plásticas- por -Música. A primeira alternativa tinha como propósito promover, dar visibilidade e competitividade aos artistas brasileiros. A Musica, sendo razão da próprria identidade  do carioca, um povo acústico, já partiria alavancada nacional e internacionalmente, pela historia da musica no Rio,onde trabalharam os grandes compositores eruditos, e sua referencia internacional em musica popular com o samba e a bossa-nova. Além do mais a Orquestra Sinfonica Brasileira passaria a ter uma sede reforçando sua centralidade nacional e qualificando-a ainda mais.

4. Uma sala de concertos seria insuficiente, por maior qualidade acústica que tivesse. Por isso decidiu-se por um Complexo tendo a Musica como tema. Desta forma o projeto passou a contar com uma grande sala de concertos, ópera e ballet, -vanguarda acústica no mundo todo-, uma segunda sala de concertos, duas salas de orquestra de câmara, uma sala acústica que seria alternativamente usada em gravações, uma escolaconservatório de musica com 10 salas, onde os professoresmusicos da OSB formariam o corpo docente. O Complexo será também um shopping cultural, com livraria, cd-dvdteca, e dois cinemas. No entorno das salas de concerto, foram definidos espaços informais como mini-teatros de arena, com a finalidade de que os estudantes de musica pudessem usá-los para se exercitar e fazer suas conversas musicais. Além de tudo, são quatro mirantes nos pontos cardeais olhando a Barra da Tijuca de diferentes formas, apoiados por cafés e restaurante, toda a parte administrativa e um grande Parque Público com gramados e um lago que serpenteia. As salas de concerto, especialmente a grande sala, estará equipada para gravação dos eventos e transmissão por TV.  E o Conservatório teria sempre uma proporção de vagas para crianças e jovens com renda mais baixa.

5. A estimativa do arquiteto é que um Complexo como esse, receba todos os dias, independente de concertos, 5 mil pessoas e que se torne um point de encontro e especialização de todos os que estudam e são aficionados pela musica, onde poderão estar todo o dia. O acesso aos espaços comuns é livre e gratuito. Além de tudo, foram desenhados grandes espaços para a exposição de artes plásticas, e por isso na origem o arquiteto tenha chamado de Cidade das Artes. A possibilidade de auto-financiamento -parcial e total- vai além dos patrocínios das empresas que tem a cultura como marketing de marca. As reuniões e encontros de grandes empresas,com concertos de gala, eventos internacionais,seriam outra forma de captação de recursos. É este complexo -que custará 250 milhões de dólares- supondo um cambio de 2 reais, ou menos se o cambio for maio,- onde já foram investidos 85% do total, sendo que todos -todos- os equipamentos estão comprados e estocados, faltando apenas as obras civis e de paisagismo.

Cesar Maia comenta fatos que atingiram a centralidade cultural do Rio

No ex-blog do dia 19 de maio, Cesar Maia fez uma breve retrospectiva sobre os fatos que fizeram com que o Rio perdesse a centralidade cultural no país. Passando por alguns momentos da História do Brasil, o ex-prefeito ressaltou que o Rio deteve a posição por várias décadas, quando passou a perder espaço e, mesmo assim, tentou reagir ao criar novas centralidades. A análise também traz o papel da imprensa neste processo. 

 

Cesar Maia lembrou que a partir do momento em que a semana de arte moderna de 1922, por circunstâncias adjetivas, foi para São Paulo, anos depois o Rio sofreu outro golpe com o fechamento da Universidade do Distrito Federal, criada por Anísio Teixeira e Pedro Ernesto. Nomes como Cecília Meireles, Hermes Lima e Candido Portinari foram perseguidos. Com isso, Candido Portinari migrou para São Paulo, onde depois foi candidato a senador.

 

– Com o término da Segunda Guerra e as obras de arte na Europa a preço da bacia das almas, Chateaubriand passou o pires aos empresários brasileiros. Praticamente só os de São Paulo apoiaram e estas obras de arte passaram a ser o acervo do MASP.

 

Cesar Maia destacou que mesmo diante deste quadro o Rio, de baixo para cima, através da cultura popular com o samba, com desdobramentos por setores médios com a Bossa Nova, ou a partir do CPC da UNE, que abriu espaços para o Cinema Novo, reagiu e forçou novas centralidades. Com o regime autoritário e o foco no Rio, novamente a cidade foi debilitada como centro cultural.

 

– A experiência internacional indicava que a recuperação da centralidade cultural exigia que equipamentos de alta qualidade que cumprissem esse papel aglutinador. Um exemplo mais recente foi o Museu Guggenheim de Bilbao. Com isso, na campanha eleitoral de 2000, a associação do Rio à Fundação Guggenheim foi apresentada como programa de governo e aprovada pelo eleitor carioca.

 

Neste período, relata Cesar Maia, foi iniciado o processo de contratação com a Fundação Guggenheim, culminando com os estudos para que o Museu, centrado em Arte Contemporânea, pudesse cumprir o papel de retomar para o Rio a centralidade em artes plásticas contemporâneas e, também, revitalizasse como âncora a área portuária. O contrato foi assinado em Nova York, com a presença da imprensa dos Estados Unidos.

 

O ex-prefeito recorda que o consagrado arquiteto francês, Jean Nouvel, desenhou o projeto básico. No entanto, uma forte pressão de parte da imprensa estimulou uma oposição política e finalmente o projeto, que já estaria pronto hoje, foi obstruído no judiciário.

 

De forma a não passar por provocação, a ideia matriz permaneceu, mas um Museu de Artes Plásticas foi substituído por um Centro de Artes Musicais, depois Cidade da Música. Mais uma vez, um arquiteto consagrado em projetos deste porte, Christian Portzamparc, foi chamado e assumiu o desafio. Foi quando nasceu a Cidade da Música, hoje localizada na Barra da Tijuca. Com o projeto pronto e os investimentos previstos em orçamento, o processo eleitoral assumiu a crítica demagógica. Na avaliação de Cesar Maia, outra vez parte da imprensa assumiu para si a função de voltar a opinião pública contra o projeto.

 

– E mais uma vez um projeto que recuperará para o Rio a centralidade em artes musicais sofre um processo de obstrução com prejuízos enormes para a Cultura do Rio. Enquanto isso, São Paulo constrói o Museu da Língua Portuguesa, de alta qualidade e sofisticação, e o Museu do Futebol da mesma forma. Vitória investe em um Centro Cultural Múltiplo. E o Rio mais uma vez é atingido por interesses menores e eleitorais (2010), prejudicando a marca de identidade de nossa Cidade. E… La Nave Va!

 

No ex-blog do dia 19 de maio, Cesar Maia fez uma breve retrospectiva sobre os fatos que fizeram com que o Rio perdesse a centralidade cultural no país. Passando por alguns momentos da História do Brasil, o ex-prefeito ressaltou que o Rio deteve a posição por várias décadas, quando passou a perder espaço e, mesmo assim, tentou reagir ao criar novas centralidades. A análise também traz o papel da imprensa neste processo. 

 

Cesar Maia lembrou que a partir do momento em que a semana de arte moderna de 1922, por circunstâncias adjetivas, foi para São Paulo, anos depois o Rio sofreu outro golpe com o fechamento da Universidade do Distrito Federal, criada por Anísio Teixeira e Pedro Ernesto. Nomes como Cecília Meireles, Hermes Lima e Candido Portinari foram perseguidos.  Com isso, Candido Portinari migrou para São Paulo, onde depois foi candidato a senador.

 

– Com o término da Segunda Guerra e as obras de arte na Europa a preço da bacia das almas, Chateaubriand passou o pires aos empresários brasileiros. Praticamente só os de São Paulo apoiaram e estas obras de arte passaram a ser o acervo do MASP.

 

Cesar Maia destacou que mesmo diante deste quadro o Rio, de baixo para cima, através da cultura popular com o samba, com desdobramentos por setores médios com a Bossa Nova, ou a partir do CPC da UNE, que abriu espaços para o Cinema Novo, reagiu e forçou novas centralidades. Com o regime autoritário e o foco no Rio, novamente a cidade foi debilitada como centro cultural.

 

– A experiência internacional indicava que a recuperação da centralidade cultural exigia que equipamentos de alta qualidade que cumprissem esse papel aglutinador. Um exemplo mais recente foi o Museu Guggenheim de Bilbao. Com isso, na campanha eleitoral de 2000, a associação do Rio à Fundação Guggenheim foi apresentada como programa de governo e aprovada pelo eleitor carioca.

 

Neste período, relata Cesar Maia, foi iniciado o processo de contratação com a Fundação Guggenheim, culminando com os estudos para que o Museu, centrado em Arte Contemporânea, pudesse cumprir o papel de retomar para o Rio a centralidade em artes plásticas contemporâneas e, também, revitalizasse como âncora a área portuária. O contrato foi assinado em Nova York, com a presença da imprensa dos Estados Unidos.

 

O ex-prefeito recorda que o consagrado arquiteto francês, Jean Nouvel, desenhou o projeto básico. No entanto, uma forte pressão de parte da imprensa estimulou uma oposição política e finalmente o projeto, que já estaria pronto hoje, foi obstruído no judiciário.

 

De forma a não passar por provocação, a ideia matriz permaneceu, mas um Museu de Artes Plásticas foi substituído por um Centro de Artes Musicais, depois Cidade da Música. Mais uma vez, um arquiteto consagrado em projetos deste porte, Christian Portzamparc, foi chamado e assumiu o desafio. Foi quando nasceu a Cidade da Música, hoje localizada na Barra da Tijuca. Com o projeto pronto e os investimentos previstos em orçamento, o processo eleitoral assumiu a crítica demagógica. Na avaliação de Cesar Maia, outra vez parte da imprensa assumiu para si a função de voltar a opinião pública contra o projeto.

 

– E mais uma vez um projeto que recuperará para o Rio a centralidade em artes musicais sofre um processo de obstrução com prejuízos enormes para a Cultura do Rio. Enquanto isso, São Paulo constrói o Museu da Língua Portuguesa, de alta qualidade e sofisticação, e o Museu do Futebol da mesma forma. Vitória investe em um Centro Cultural Múltiplo. E o Rio mais uma vez é atingido por interesses menores e eleitorais (2010), prejudicando a marca de identidade de nossa Cidade. E… La Nave Va!

Reforma política!

Publicado em 23.05.2009 em Folha de São Paulo

A DIFICULDADE imposta ao eleitor por nosso sistema eleitoral impossibilita pensar em qualidade do voto. Um eleitor britânico vota para deputado em seu distrito e escolhe entre três alternativas (trabalhista, conservador, liberal-democrata). O eleitor norte-americano, entre duas (democratas e republicanos). O espanhol escolhe a lista e opta entre duas (PSOE e PP) e, regionalmente, mais uma. O eleitor alemão, na lista e nos distritos, escolhe entre cinco opções (CDU, SPD, PV, PLD e SDP).

No voto proporcional aberto no Brasil, numa eleição com 15 chapas para deputado, o eleitor escolhe entre 1.500 candidatos. Passam todos na telinha, nos panfletos, nos cartazes, nos carros de som. Dias depois, pouca gente lembra em quem votou. A representatividade nesse tipo de eleição é nenhuma.
Os deputados são “donos” de seus mandatos e podem “se lixar” à vontade. Com quase nula representatividade parlamentar, os partidos não podem ser orgânicos. São antípodas: a gestação do mandato e a integridade dos partidos.

O debate sobre reforma política tem duas preliminares: como facilitar a escolha do eleitor e como fortalecer a integridade política dos partidos. E deve-se garantir equidade aos partidos -governo ou oposição- na comunicação com o eleitor.

Os governos tem publicidade ilimitada, com enormes vantagens sobre à oposição. Com isso, mais de 90% dos candidatos à reeleição chegam ao segundo turno e mais de 85% ganham a eleição. A reforma deve incluir três pilares: facilitar o eleitor, fortalecer os partidos e dar equidade na comunicação entre governo e oposição.

Na experiência das democracias mais avançadas, a terceira questão se resolve com a proibição de os governos fazerem publicidade, exceção a suas empresas que estejam em mercado. Assim, o horário partidário gratuito seria efetivamente paritário e não seria burlado pela publicidade governamental. Quanto aos demais, teríamos dois caminhos: um, o da invenção (Tancredo: invenção aqui ou é jabuticaba ou é besteira) de um sistema novo; outro, o da adaptação dos sistemas existentes e comprovados.

A adaptação do sistema eleitoral seria entre três vetores ou variantes: o anglo-americano, de voto distrital puro; o espanhol, de voto em lista; o alemão, de voto (misto) distrital e de lista. As variantes seriam sobre os distritos: se uninominais, como o anglo-americano, ou plurinominais, como o espanhol em lista. O voto distrital puro encontraria uma resistência política: a desproporcionalidade contra SP, que o voto distrital corrigiria. De forma prática, há que caminhar para um tipo de combinação onde a lista estivesse presente. Ou… seria manter o eleitor confuso e os partidos difusos.

Floriano Peixoto e SP

Publicado em 16.05.2009 em Folha de São Paulo

170 ANOS do nascimento de Floriano Peixoto (30/4). Presidente de novembro de 1891 a 1894. Único oficial que participou do primeiro ao último dia da Guerra do Paraguai. Dirigente maior do Exército, em 89, manteve uma postura profissional na conspiração que levou à República. Informado na última hora, foi neutralizado. A habilidade dos líderes políticos de São Paulo, no início da República, e a aliança com Floriano Peixoto explicam a hegemonia política que São Paulo (não tendo no Império) conquistou. Compartilhou com Campos Sales o ministério no governo provisório e se aproximou do grupo paulista -Prudente de Moraes, Campos Sales e Rodrigues Alves.

Promulgada a Constituição, o Congresso elegeu os primeiros presidente e vice da República. Formou na chapa Prudente de Moraes/Floriano Peixoto. Venceu Deodoro com 129 votos, contra 97 de Prudente. Floriano, com 153 votos, derrotou o almirante Wandenkolk, 57 votos, republicano de primeira hora. Inconformado, Prudente de Moraes inicia uma obstrução parlamentar de forma a inviabilizar o governo de Deodoro. Este, sem vocação política, vai perdendo base parlamentar. Dissolve o Congresso em 3/11/1891 num golpe de Estado. O Congresso e a Marinha reagem e dão um ultimato a Deodoro, que renuncia. Floriano assume. Abre-se um debate constitucional sobre se cabe ou não nova eleição. O relator é Campos Sales, que entende que Floriano é o presidente até o final do mandato de Deodoro. O Congresso ratifica. Floriano assume com seu estilo frio, sóbrio, impessoal.

Em seu primeiro ministério, Rodrigues Alves é o ministro da Fazenda. Os primeiros motins são sufocados. O Senado, sob a liderança de Campos Sales, apoia Floriano. Em 31/3/1892, 13 generais, Wandenkolk à frente, lançam um manifesto exigindo a renúncia de Floriano. São presos, reformados e, com líderes civis, desterrados. O processo não para. Articula-se uma revolta com parte da Marinha, liderada pelo almirante e ministro Custódio de Melo. Prudente de Moraes vacila, e Campos Sales contata o almirante.

Leva-se ao ministério a proposta. Rodrigues Alves vota por nova eleição, fica isolado, acata e, junto ao grupo paulista, dá sustentação parlamentar a Floriano. A Revolta da Armada -setembro de 1893- é respondida pelo Congresso, que autoriza Floriano a decretar estado de sítio quando precisar. Com tal apoio, Floriano reprime a rebelião até eliminá-la, em março de 1894, mês da eleição presidencial. Vence Prudente de Moraes. Os próximos presidentes após ele serão Campos Sales e Rodrigues Alves, abrindo o ciclo republicano de hegemonia paulista. Floriano morre em 1895, com 56 anos.

Derivativos da política!

Publicado em 09.05.2009 em Folha de São Paulo

A CRISE FOI o foco dos discursos no Congresso do PPE (partidos de centro/centro-direita), bloco majoritário no Parlamento Europeu, que conta com vários primeiros-ministros (Alemanha, França, Itália, Bélgica, Suécia etc.). No encontro de abril, preparatório à eleição de 7 de junho, os mais importantes líderes europeus repetiram a mesma tese: a crise econômica tem como preliminar uma crise de valores. Esses valores éticos foram ignorados nesse mundo de derivativos, especulações, abuso de riscos, paraísos fiscais.

A sociedade é um sistema de vasos comunicantes. Não haverá um mundo empresarial ético e um mundo político aético, ou vice-versa. Não há abuso de restrições legais e de ética de mercado se não houver cumplicidade entre empresários e políticos. Não há corrupto sem corruptor. Não há achacador sem a fragilidade do achacado. O que se vê hoje já se sabia. Os especuladores ganhavam e autoridades políticas se omitiam, com proveito pessoal.

Cabe buscar os paralelos entre um e outro mundos. Por exemplo, no caso dos derivativos. Esses representam operações financeiras cuja relação com os fatos reais (empréstimos, emissão de capital, produção) vai se tornando cada vez mais tênue, até que, no cume da pirâmide, elas fiquem soltas, sem lastro.
No mundo político, isso ocorre de forma parecida, e não faltam fatos divulgados para comprovar. A atividade política envolve as ações de governo e das oposições, a legislação, a mobilização de militantes e da opinião pública, a defesa pública de interesses, as articulações para a obtenção de massa crítica de opinião ou de voto e as eleições.

Para isso, os políticos contam com a sustentação partidária, os partidos, com o fundo partidário, acesso a rádio e TV e doadores formais. Os parlamentares contam com salários e gabinetes, incluindo assessores e benefícios que garantam mobilidade e comunicação. As distorções vêm do uso de derivativos políticos sobre elementos de sustentação, autorizado em lei.

É longa a lista. Nomeações nas máquinas de governo como uma extensão de gabinetes, atos e votos trocados por favores empresariais e governamentais, uso dos direitos de gabinete para ganhos pessoais (fantasmas, parte dos salários de assessores, venda de passagens, verba de gabinete usada fora da atividade política, cartões de crédito da mesma forma), sobras de campanha, doações cruzadas e por aí vai. A crise de valores e os vasos comunicantes garantem que parte das elites, política e empresarial, opere no mesmo mundo, descolando a atividade-fim, dos lastros legal e moral.

Os derivativos políticos fazem parte da mesma crise de valores.

Crise de valores

Artigo publicado no Jornal O Globo em 05/05/2009.

As eleições para o Parlamento Europeu (07/06) estão marcadas pela crise. Em Varsóvia (de 28 a 30/04) reuniu-se o Congresso do PPE (bloco dos chamados partidos populares europeus no Parlamento Europeu).

Participaram líderes, deputados e delegados dos partidos que formam esse bloco.

O Parlamento Europeu é constituído por três blocos partidários. O PPE — majoritário — reúne partidos de centro/ centro-direita, e tem a hegemonia dos governos na União Europeia (Alemanha, França, Itália, Holanda, Luxemburgo, Bélgica, Grécia, Suécia, entre outros); o bloco socialista — força intermediária; e o bloco liberal de centrodireita. Estiveram reunidos três mil delegados para definir o programa unitário que defenderão dia 7.

O PPE continua favorito e deverá ampliar sua maioria relativa. O Congresso foi subdividido em três partes.

As reuniões plenárias com vistas a consensuar-se um documento final, a assembleia geral com a palavra dos primeiros ministros do PPE e dos líderes dos partidos, e as reuniões temáticas coordenadas pelo centro de estudos do PPE. Durão Barroso será reconduzido à presidência administrativa da EU, com apoio do PSOE — espanhol — e do Labor — britânico —, apesar das divergências no bloco socialista.

A mesa temática de abertura teve Martens — presidente do Parlamento Europeu — como expositor central. Alguns destaques merecem registros nas reuniões temáticas. Na crise não sobrevivem os mais fortes nem os mais inteligentes, mas os que conseguem responder às mudanças.

É inadmissível usar a questão energética como barganha política. O etanol brasileiro se torna inviável para a Europa pelo custo de transporte. Volta a questão da energia nuclear.

Mais importante que sair da crise é sair dela na direção correta. As restrições novas ao mercado financeiro devem ser medidas por sua efetividade e não retórica. Não se fala mais de G-8, mas de G-20. O ponto alto do Congresso foi a assembleia geral onde os primeiros-ministros e líderes dos partidos discursaram. Um elemento integrou os discursos: a crise econômica tem como preliminar a crise de valores, e esta é que abriu o flanco para a orgia de derivativos, paraísos fiscais, omissão de riscos…

Sem este entendimento, a crise não será superada. Portanto, deve-se adjetivar a economia de mercado com expressões como “responsável” e “ética”. A superação da crise deve ser como um renascimento moral.

Marcou-se a diferença com as políticas populistas para enfrentar a crise.

São elas as políticas compensatórias de curto prazo, que devem ser vistas apenas como atenuantes. Reforçou-se a importância do euro: sem ele a crise teria sido mais intensa. Os países da UE que ainda não adotaram o euro, Polônia inclusive, entendem de forma diferente e acham que ganharam flexibilidade com as moedas locais.

A intervenção estatal é necessária hoje, mas a sustentabilidade do crescimento futuro requererá um refluxo dela. As relações transatlânticas são cada vez mais importantes. A segurança energética é um tema central, mas tendo cuidado com a demagogia ambiental buscando efeito mediático.

A “mão invisível” foi uma aposta equivocada: as regulamentações devem acompanhar a economia social de mercado. Regulamentação não é burocratização. Mercado e Estado não são dogmas. O centro de tudo é a sociedade. Reforça-se mais que nunca a UE: “Ela fez a reconciliação entre a história e a geografia.” Ninguém tem o monopólio do social.

A união monetária deve apontar para a união financeira. Fillon — premier francês— disse que só falta força quando fracassa o espírito. Que os estados devem tomar decisões e não se envolver em consensos frágeis. Que ampliar a UE não é um objetivo em si mesmo. Merkel disse que a Europa não pode ser neutra nem técnica.

Cada item destes é uma tese que merece a reflexão dos partidos e políticos brasileiros.

CESAR MAIA foi prefeito do Rio e como observador do DEM do Congresso do PPE realizado em Varsóvia, na semana passada.

Pré-campanha!

Publicado em 02.05.2009 em Folha de São Paulo

PAUL LAZARSFELD -fundador das pesquisas de opinião e tendências do eleitorado-, nos anos 30, na Universidade de Columbia, dizia que as campanhas eleitorais eram como a fotografia da época: dividiam-se em duas fases. Na primeira -a pré-campanha-, a foto era tirada e impressa no celuloide. Na segunda -a campanha-, a foto era revelada na câmara escura. Sem a pré-campanha não havia foto a revelar, e a campanha seria uma loteria de impressões, ensinava.

Esta é a lógica das primárias nos EUA. Os pré-candidatos se apresentam nacionalmente. Mostram propostas, criticam os adversários, durante meses, até a convenção.

Todas as imagens estão amplamente registradas no “celuloide” dos eleitores. Depois, a campanha exibe os detalhes, os compromissos e críticas, que complementam o básico. Sem pré-campanha, Obama nunca teria tido a chance de ser o candidato democrata.

No Brasil, o complexo eleitoral, composto pelos partidos e pela Justiça, fixou a ideia de que a pré-campanha é ilegal. Desta forma, enquanto os partidos denunciam seus adversários por fazerem pré-campanha, a Justiça Eleitoral os inibe com proibições e punições. Mas esse é um processo torto.
Todos têm espaço partidário igual para a propaganda autorizada, mas quem está no governo tem todo o tempo que entender para contratar publicidade na mídia.

Não pôr o nome na publicidade de quem está na mídia espontânea todos os dias é risível. Nos Estados e grandes capitais, trata-se de gastos anuais, em publicidade político-governamental, de R$ 50 milhões a R$ 200 milhões. No nível federal, os gastos chegam a R$ 2 bilhões, incluindo patrocínios e promoções. O exagero chega a tal ponto que o próprio uso da internet -meio democrático, barato e acessível a todos- passou a ter regras limitativas, antes e até durante as eleições.

Se o que se quer com o processo eleitoral é dar ao eleitor o máximo de informações, para que ele possa decidir politicamente, em vez de apenas reagir a estímulos publicitários, o processo atual aponta para o contrário disso.

Os partidos não têm tempo para amadurecer suas decisões em torno de seus pré-candidatos. As convenções fazem o jogo do “convencimento” dos delegados. As pesquisas de opinião pré-eleitorais só favorecem os mais conhecidos ou expostos, o que torna as oposições mais dependentes da mídia.A democracia sofre um grave desvio, na medida em que não há condições de igualdade na disputa.

Governo e oposição atuam politicamente, visando às próximas eleições, com instrumentos totalmente desproporcionais. Essa é uma grave distorção que os partidos políticos -que legislam- e o TSE -que regulamenta- precisam rever com a máxima urgência.